O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

O OUTRO LADO DA MOEDA

Master, a ponta de um perigoso iceberg

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Publicado em 18/11/2025 às 17:05

Alterado em 18/11/2025 às 20:28

A sede do Banco Master, na Faria Lima Foto: reprodução

Desde que aprovou a compra do Banco Voiter pelo Master, de Daniel Vorcaro, em 11 de abril de 2024, o Banco Central já devia ter percebido que o banco não ia bem. Ou seja, demorou um ano e meio para o Banco Central decretar a liquidação do Banco Master e a Polícia Federal prender Vorcaro. Isso ocorreu ontem à noite em Guarulhos, quando ia deixar o Brasil e em um dos seus jatos, além de outros dirigentes e sócios do conglomerado, acusados de fraudes de R$ 12 bilhões pelo diretor geral da PF, Andrei Rodrigues. Paulo Henrique Costa, presidente do BRB (o banco do DF) também foi preso, acusado de acobertar o rombo do Master ao se dispor a comprar 49% do banco em março.

Vorcaro alega que estava viajando para o exterior para fechar os detalhes da venda do conglomerado Master para o Fictor e um grupo de investidores dos Emirados Árabes Unidos, que iriam pagar R$ 3 bilhões pelo controle do Master, o que chegou a ser anunciado na mídia. As investigações da PF vão dizer se a negociação era real ou apenas uma cortina de fumaça para a evasão de Vorcaro, que nunca foi bem-visto na Faria Lima.

Mesmo em dificuldades, em agosto do mesmo ano, o Master teve o OK do BC para comprar o conglomerado do Will Bank. Como observou a auditoria da KPMG no balanço de dezembro de 2024, o Master tinha muitos investimentos (e lucros) oriundos de fundos de investimento que aplicam “substancialmente em ativos que não são ativamente negociados”.

Ou seja, a mensuração dos valores e ganhos estava “sujeita a um nível maior de incerteza, especialmente em relação à definição do risco de crédito e de realização de tais ativos.” Em outras palavras, tanto o lucro líquido anunciado de R$ 1,067 bilhão quantos as Provisões para Devedores Duvidosos de R$ 578 milhões, eram de difícil comprovação, segundo a KPMG.

Muito se fala do impacto sobre o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) dos CDBs do Master, que pagavam mais de 40% acima do rendimento médio dos DIs desde o fim do ano passado. O FGC garante o principal dos depósitos até R$ 250 mil. Segundo o FGC, são R$ 41 bilhões com origem no Master. Com os juros extras, a conta aumentaria para R$ 350 mil.

Por isso, no mercado comenta-se que o FGC estaria propenso a honrar apenas o principal investido. Os juros extras acima da média do mercado eram um risco virtualmente assumido pelo investidor (pessoa física ou jurídica). Muita corrupção também envolve aplicações de fundos de pensão do setor público (o Rio Previdência, dos funcionários do RJ tinha R$ 2,6 bilhões aplicados em papéis do Master e o Prece (da Cedae) tinha mais de R$ 200 milhões. Mas dois fundos de pensão go governo da Bahia também investiam forte nos papéis do Master, sob o atrativo dos juros altos. Ou seja, as investigações podem ter respingos que atinjam diretamente mais de 50 pessoas. Não só no mercado, mas nos governos do DF, RJ e da Bahia, terra do ex-governador Rui Costa, chefe da Casa Civil de Lula.

Mas há outro campo perigoso. Devido ao valor incerto de seus Fundos de Investimento Creditórios (FDIC), cujo montante geral do mercado é de quase R$ 900 bilhões, pode pôr em xeque a situação de dezenas de instituições que copiavam o modelo do Master. No parecer sobre o balanço de 2024, a KPMG observou que “a mensuração a valor de mercado dos fundos de investimentos como um principal assunto para a nossa auditoria, devido à relevância dos montantes e às incertezas envolvidas na determinação do risco de crédito e da realização futura dos ativos investidos pelos Fundos”.

Iceberg flutuante
A compra dos dois bancos foi uma forma de mascarar lucros e eventuais perdas e a KPMG sublinhou que a “aquisição de investimentos exige sua avaliação no momento inicial”. Os aspectos contábeis adotados pelo Master o levaram a reconhecer “ganho por compra vantajosa (...) de R$ 435,5 milhões na “aquisição dos investimentos envolvidos no Will Bank (...) cujo laudo de alocação do preço de compra (PPA) está em elaboração”.

Esses resultados foram impactados positivamente, sobretudo, pelos fundos de investimentos – FIDC, FIM e FIA, utilizados como veículos para créditos “corporate” e operações estruturadas, otimizando a eficiência operacional.

O banco de Vorcaro era um perigoso iceberg flutuante no mercado financeiro desde o primeiro trimestre deste ano, tanto que em fins de março Vorcaro apresentou ao BC proposta de compra de 49% das ações pelo Banco Regional de Brasília (BRB), o banco do Distrito Federal, mas o negócio foi vetado em outubro. No desespero, anunciou na noite de ontem a venda para o EAU.

CVM fecha o cerco

Para fechar o cerco sobre o mercado de Fundos, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), publicou o Ofício-Circular nº 8/2025 com interpretação técnica que vai impactar o mercado de fundos no Brasil. Elaborado pela Superintendência de Securitização e Agronegócio, esclarece pontos da Resolução CVM 175, que rege a estrutura dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), Fundos de Investimento Imobiliários (FII) e Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas do Agronegócio (Fiagro).

Os FII podem investir em carteiras de créditos imobiliários por meio de cotas de FIDC e Fiagro, sem que isso implique violação das restrições legais à composição de suas carteiras. O ofício ainda trata da equiparação das cotas de Fiagro às cotas de FIDC, da responsabilidade dos gestores na verificação do lastro nos FIDC, da atuação dos agentes de cobrança nos FIDC voltados a investidores profissionais, do recebimento de garantias por esses fundos, do investimento cruzado entre FIDCs sob o mesmo gestor, do registro dos direitos creditórios em Fiagros, da possibilidade de investimento em sociedades por Fiagros, bem como da renúncia do administrador nesses fundos.

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