O OUTRO LADO DA MOEDA
Vale e Samarco tentam socializar prejuízos
Publicado em 24/10/2025 às 16:55
Alterado em 24/10/2025 às 16:55
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o Brasil é o país da impunidade – pelo menos para os poderosos, que podem contratar custosas bancas de advocacia para protelar execuções criminais -, já estamos cansados de saber. Vejam o caso da tragédia de Mariana (MG), que completa 10 anos dia 5 de novembro.
Por volta das 16:20 do dia 5 de novembro de 2015 houve o rompimento da barragem de Fundão, localizada em Bento Rodrigues, a 35 km do centro do município de Mariana. A tragédia causou a morte de 19 pessoas, provocou o aborto de um bebê em uma sobrevivente e trouxe destruição a toda uma comunidade. Mais de 600 pessoas ficaram desabrigadas, além de 1,2 milhão sem acesso à água potável.
A catástrofe também afetou o ecossistema da região. Estima-se o despejo de mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, compostos principalmente por óxido de ferro, água e lama. O material contaminou a bacia do rio Doce e seus afluentes, que se estendem por Minas Gerais e Espírito Santo, até desaguar no Atlântico, a 663 km do local do rompimento. Os impactos dos rejeitos lançados na foz do rio Doce contaminaram o litoral sul da Bahia e o norte do Rio de Janeiro. Cerca de 50 municípios foram atingidos – o que consolidou o rompimento na maior tragédia ambiental da história do Brasil.
A barragem era gerenciada pela Samarco, uma mineradora cujo controle era dividido entre a brasileira Vale e anglo-australiana BHP Billiton, que iniciou sua operação em 2008. A responsabilidade da BHP Billiton foi reconhecida por um tribunal de Londres, o que pode gerar indenizações de bilhões de dólares (a serem calculados até 2027). Ante tantas indenizações, a Samarco pediu Recuperação Judicial, para ganhar fôlego e protelar os pagamentos.
Já a Vale vinha contornando as reparações com um auxílio emergencial pago mensalmente aos atingidos desde a tragédia, num montante de R$ 4,4 bilhões, cerca de 11,7% do total de R$ 37,68 bilhões previstos no acordo de indenização por Mariana. Ou seja, os principais responsáveis pelo rompimento das barragens de rejeitos que estavam operando acima do risco – a maior parte das barragens de mineração em Minas Gerais foi “descomissionada”, ou seja, foram desativadas em MG.
O que não impediu o rompimento de Brumadinho em janeiro de 2019, uma barragem operada apenas pela Vale, com quase 300 mortes. Só então, aumentou o rigor sobre as barragens. Até hoje a maior parte das vítimas das duas tragédias continua sem a reparação integral pelos danos causados pelos rompimentos das barragens. Atrasos em indenizações, reassentamentos incompletos e ausência de recuperação ambiental plena são aspectos que confirmam a trajetória lenta e desigual.
A justiça dos poderosos
Enquanto a Vale e a Samarco tentavam procrastinar as indenizações, seus departamentos jurídicos e financeiros trataram de socializar parte dos prejuízos, mas foram pegos e multados em R$ R$ 1,92 bilhão pela Receita Federal do Brasil, tentando abater do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) os valores gastos com reparações ambientais e multas decorrentes da tragédia ambiental ocorrida em 2015, quando do rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG).
Como se diz em Minas, depois da ofensa, tentaram o coice. Mas, não pegou...
Inflação cai no Brasil e sobe nos EUA
A inflação de outubro só será divulgada pelo IBGE em 11 de novembro, mas a prévia do mês – o IPCA-15, divulgado hoje, com alta de 0,18%, aquém da mediana do mercado (0,21% e dos 0,25% previstos pela 4Intelligence, numa baixa considerável ante os 0,48% do IPCA-15 de setembro), reforça as expectativas de que o IPCA possa fechar o ano dentro do teto da meta de inflação (3,00%+tolerância de 1,50%=4,50%). O Itaú reduziu a expectativa do IPCA para 4,6%. Em setembro previa 5,0% e baixou a 4,7% em 15 de outubro.
Além da baixa de 4,9% da gasolina a partir do dia 22, que terá só um terço do impacto este mês, os indicadores do IPC-S da FGV, com alta de apenas 0,19% e baixa em sete capitais, apontam para a desaceleração da inflação. No IPCA-15, a Alimentação e Bebidas caiu 0,02%, a 5ª baixa seguida (-0,10% na Alimentação em domicílio).
Dois fatos chamam a atenção e reforçam as expectativas sobre o encontro entre os presidentes Lula e Trump, neste domingo, na Malásia, durante a reunião da ASEAN, que têm duas commodities brasileiras, o café e a carne, no centro das discussões sobre tarifas. As carnes voltaram a cair 0,03% no IPCA-15, acumulando queda de 0,14% de janeiro a outubro. Entretanto, nos últimos 12 meses, os preços subiram 15,89%. Se os EUA acenarem com a redução das tarifas nas exportações, para aliviar os preços da carne aos americanos, pode haver alteração no mercado, mas sem a explosão de alta de 2024, em boa parte causada pela escalada do dólar.
O café começa a ter baixa de preços nos supermercados brasileiros (a alta acumulada, que chegou a passar de 80% em 12 meses, estava em 17,37% nos últimos 12 meses até o IPCA-15 de outubro) e pode ter alívio nas tarifas americanas. Os preços caíram 1,72% hoje na Nymex, a bolsa de mercadorias de Nova Iorque.
O que pressionou a prévia da inflação foi a alta de 3,09% do etanol. Misturado em 30% à gasolina, ele fez o litro subir 0,99% nas bombas. Ou seja, o álcool, além de causar risco de vida pela mistura do metanol em bebidas alcóolicas, também ameaça o esforço de redução da inflação e dos juros.
Nos EUA, o CPI avançou 0,3% em setembro, após subir 0,4% em agosto. Nos 12 meses até setembro, o índice cresceu 3,0%, contra 2,9% em agosto. A expectativa era de uma alta de 0,4% no mês e de 3,1% em relação ao ano anterior. O resultado reforçou a expectativa de corte de juros pelo Fed na quarta-feira, 29, -- um fator que também atua para que as taxas no Brasil caiam, como ocorreu na curva a termo nesta manhã.
O Banco Central só decide a Selic (15% ao ano) uma semana depois, em 5 de novembro. Antes do CPI, as taxas dos DIs no Brasil já oscilavam em baixa em alguns vencimentos, após o IPCA-15 vir abaixo das expectativas. No momento, os juros reais ultralongos, com vencimento acima de 25 anos, estão acima de 7% e, a depender do cenário eleitoral, teriam espaço relevante para cair.
Para Frederico Catalan, gestor de renda fixa do Banco Opportunity, um dos maiores investidores do mercado imobiliário (que precisa operar com juros mais baixos), os juros poderiam cair para a casa dos 5,5% caso o mercado vislumbre a possibilidade de alguma austeridade fiscal a partir de 2027, afirmou em entrevista ao “Valor Econômico”.