O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Bancos caem com medo de sanções e dólar sobe

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Publicado em 19/08/2025 às 14:37

Alterado em 19/08/2025 às 14:37

Bancos brasileiros às voltas com os efeitos da Lei Magnitsky Fotos: reproduções

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Os dirigentes de bancos e instituições financeiras brasileiras que têm operações de filiais nos Estados Unidos, linhas de crédito ou licenças de serviços com bancos americanos entraram em pânico desde ontem, com a interpretação, que consideram irrealista, do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal, sobre o alcance de punições de leis estrangeiras no território nacional. E as ações de bancos lideram as baixas da B3 hoje, quando o Ibovespa opera em queda de 1,905

De fato, sentenças judiciais de países têm efeito limitado no estrangeiro. Embora as sanções da Lei Magnitsky sobre o ministro Alexandre de Moraes e família, bem como outros sete ministros do STF, incluindo Dino, e o PGR, Paulo Gonet, além do ministro da Saúde e família, Alexandre Padilha, por ora, só atinjam operações financeiras e vistos nos Estados Unidos, há potencial de represálias americanas contra as instituições financeiras brasileiras que ignorarem as sanções. E vale lembrar que a decisão de Dino é sobre uma arguição de inconstitucionalidade em mineração, por parte do IBRAM, que foi extrapolada para a Lei Magnitsky.

Por isso, nesta terça-feira, dia em que o dólar andou de lado, com pequenas desvalorizações diante do euro, libra esterlina, iene e franco suíço, o real tem uma das maiores perdas, com o dólar cotado a R$ 5,4690, com alta de 0,60%. E, na B3 a forte baixa das ações dos bancos brasileiros com interligação com o mercado americano provocou queda de 1,90% no Ibovespa por volta do meio-dia (horário do Brasil). Nos bancos há reuniões sucessivas para se medir os riscos de sanções e seus impactos nos “fundings” bancários.

A dependência dos bancos brasileiros às linhas de crédito do mercado financeiro americano (o maior do mundo) é muito forte. Quando houve a crise financeira mundial de agosto-setembro de 2008, devido ao colapso do mercado do “subprime” de hipotecas que levou à quebra do Lemann Brothers, a paralisação do fluxo internacional de crédito privou bancos brasileiros de “fundings”. Maior vítima da asfixia financeira, o Unibanco teve de se unir ao Itaú.

BB, Itaú, Bradesco, BTG e Santander que são bancos globais, têm filiais e linhas de crédito nos EUA, além de operarem com bandeiras de cartões de crédito americanos (Mastercard, Visa e American Express). Agora as ações de BB ON caem 3,94%, Bradesco ON tem baixa de 3,19%, Bradesco PN cai 3,55%, Itaú Unibanco perde 3,31% e afeta Itaúsa, com baixa de 3,22%, enquanto BTG Pactual cai 3,485 e Santander Brasil tem baixa de 2,49%.

AmCham Brasil prega diálogo

Em resposta ontem à consulta pública conduzida pelo governo dos Estados Unidos no âmbito da investigação da Seção 301 sobre práticas comerciais do Brasil, em documento submetido ao Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês), a Amcham Brasil reforça a importância da cooperação bilateral e do diálogo construtivo como o caminho mais eficaz para lidar com as preocupações levantadas pelos EUA. Segundo a entidade, esse processo tem maior potencial de gerar soluções de interesse mútuo, evitando impactos negativos sobre empresas, cadeias produtivas e trabalhadores em ambas as economias.

A investigação da Seção 301 em curso examina medidas e políticas públicas do Brasil em áreas como comércio digital e serviços de pagamento eletrônico, tarifas preferenciais, combate à corrupção, proteção da propriedade intelectual, acesso ao mercado de etanol e combate ao desmatamento ilegal. Em relação a esses temas, a Amcham destacou avanços ocorridos no Brasil, além de oportunidades para aprofundar a cooperação bilateral para tratar as preocupações americanas de forma construtiva.

A entidade também alertou que a imposição de tarifas abrangentes – como a tarifa de 50% recentemente aplicada sobre parte significativa das exportações brasileiras – pode gerar efeitos adversos nos dois países, além de abrir espaço para eventuais contramedidas brasileiras. A Amcham Brasil defende que os dois países reforcem a cooperação bilateral e adotem uma agenda positiva que vá além dos temas da investigação em curso, de modo a preservar a relação econômica bilateral – marcada por mais de um século de comércio e investimentos. Abaixo as principais observações e sugestões:

Comércio e investimentos bilaterais

Superávit consistente dos EUA: Em 2024, os EUA registraram superávit de US$ 6,8 bilhões em bens e US$ 23,1 bilhões em serviços no comércio com o Brasil. Nos últimos dez anos (2015–2024), o superávit acumulado em bens e serviços foi de US$ 257 bilhões.

Acesso facilitado ao mercado brasileiro: Mais de 70% das exportações americanas entram no Brasil com tarifa zero.

Integração produtiva: Em 2024, 33,7% do comércio bilateral foi entre subsidiárias e afiliadas das mesmas multinacionais brasileiras e americanas, fortalecendo cadeias de suprimento e reduzindo custos.

Investimentos recíprocos: O Brasil é fonte relevante de investimentos nos EUA, sustentando mais de 110 mil empregos em diversos setores. Já os EUA são o maior investidor estrangeiro no Brasil, com mais de 3.900 empresas no país; entre 2015 e 2024, subsidiárias americanas remeteram US$ 54,2 bilhões em lucros para suas matrizes.

Comércio digital e serviços financeiros

Plataformas digitais: a regulação sobre responsabilidade de plataformas digitais ainda está em discussão no Legislativo e Executivo, após decisão temporária do STF, abrindo espaço para um debate estruturado e para o diálogo bilateral construtivo, com vistas a uma regulação que deve ser justa, transparente e não discriminatória.

Transferência internacional de dados: O Brasil adota um modelo que permite múltiplos mecanismos para transferências internacionais de dados. Diante da forte integração digital entre os dois países e da relevância dos fornecedores norte-americanos para o setor tecnológico brasileiro, há oportunidade de ampliar o comércio e os investimentos bilaterais, além de promover interoperabilidade regulatória e reconhecimento mútuo de padrões.

Tarifas preferenciais

Acordos preferenciais do Brasil: Os acordos de escopo parcial com Índia e México são autorizados pelas regras internacionais, têm alcance restrito e impacto marginal sobre o comércio brasileiro.

Acesso dos EUA ao mercado brasileiro: Os EUA desfrutam de acesso mais favorável ao mercado brasileiro que diversos parceiros preferenciais. Isso se deve a regimes especiais como o ex-tarifário e suspensões tarifárias setoriais, além da forte integração produtiva bilateral. O resultado é uma tarifa média efetiva de 2,7% para os EUA abaixo da aplicada ao resto do mundo (5,2%).

Propriedade intelectual

Avanços e desafios: O Brasil enfrenta desafios estruturais na proteção da propriedade intelectual (PI), mas vem avançando com iniciativas como a Estratégia Nacional de PI. Os esforços de repressão à pirataria física e digital, reconhecidos pelo “Special 301 Report” dos EUA de 2025, devem ser intensificados.

Blocklog de patentes: O governo brasileiro tem adotado medidas para reduzir atrasos na concessão de patentes, que caiu em média para 2,9 anos, como a contratação de novos examinadores e a adesão ao “Global Patent Prosecution Highway”. Ainda assim, os prazos seguem como desafio relevante, sobretudo nos setores de saúde e biotecnologia.

Agenda positiva: Há espaço para avanços adicionais, com foco na redução efetiva dos prazos de patentes e no fortalecimento da legislação antipirataria. Medidas como tarifas não solucionam os problemas de PI e podem comprometer os progressos já alcançados por meio da cooperação bilateral.

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