
O OUTRO LADO DA MOEDA
Trump desbanca Francis Drake, o grande pirata
Publicado em 11/08/2025 às 16:19
Alterado em 11/08/2025 às 16:19
As atitudes imperiais de Donald Trump, que resvalam para a pirataria, na tentativa de salvar uma economia que perde a corrida tecnológica para a China e ainda luta para manter a hegemonia do dólar, lembra a pirataria de Francis Drake, o mais famoso corsário inglês. No final do século XVI, a Inglaterra não era um grande reino, se comparado aos de Portugal e Espanha, que vinham extraindo riquezas das colônias que descobriram no novo mundo. Também ficava atrás dos reinos da França, do império Austríaco e o dos Países Baixos, com suas prósperas Companhias das Índias Orientais e Ocidentais.
Mas a ilha inglesa tinha uma experiente armada marítima.na qual se destacava Francis Drake. Nomeado corsário oficial do reino de Elisabeth I, Drake trouxe riqueza ao Erário inglês ao saquear, em pleno Oceano Atlântico, navios espanhóis repletos de moedas de prata e ouro na travessia das colônias americanas para a Europa. Navios portugueses também foram pilhados. Por fim, após repetir as pilhagens lucrativas, Holanda, França e Inglaterra tentaram invadir o Brasil, a Argentina e as terras hoje ocupadas pela Venezuela.
Algumas invasões duraram anos como a da Holanda em Pernambuco, com expansão à Bahia e ao Ceará; e a da França, do Maranhão ao Pará, após serem expulsos do Rio de Janeiro. O Brasil, que, pelo Tratado de Tordesilhas, acabava em Santa Catarina, teve ocupação temporária dos ingleses na futura ilha de Florianópolis. Portugal então trouxe famílias açorianas para colonizar a ilha. Expulsos, os ingleses desceram o Atlântico em direção ao Sul e ocuparam Buenos Aires (o domínio das Falklands foi o que restou da ocupação).
A pirataria comandada por Francis Drake lhe rendeu riqueza e prestígio. A rainha Elizabeth I condecorou Drake como cavaleiro em 1581 Por sua participação importante da derrota da então “invencível armada” espanhola, em 1588, foi elevado ao cargo de vice-almirante do Reino da Inglaterra. Morreu em 1596 de desinteria, após um ataque fracassado a San Juan (Porto Rico). Mas o capital acumulado pelo reino inglês facilitou os futuros investimentos na Revolução Industrial;
Ao exigir que grandes produtoras de chips (semicondutores) como a Nvidia e a AMD paguem ao Tesouro americano 15% da receita de determinas vendas de semicondutores para a China (o H20 AI Accelerator, da Nvidia, e o MI308, da AMD), numa alternativa à proibição anterior da administração Trump, que passou a exigir licenças de exportação para serem vendidos, acendeu alertas entre especialistas em comércio internacional.
Mesmo para um governo que já ultrapassou repetidas vezes os limites legais no uso de medidas econômicas para remodelar o cenário global de negócios, um novo acordo com duas gigantes de tecnologia está sendo considerado excessivo. Ouvido pela Bloomberg, o ex-negociador comercial dos EUA e hoje membro do ISEAS – Yusof Ishak Institute, em Cingapura, Stephen Olson fopi taxativo: “Chamar isso de incomum ou sem precedentes seria um eufemismo chocante”, disse. “O que estamos vendo é, na prática, a monetização da política comercial americana, na qual empresas dos Estados Unidos precisam pagar ao governo para ter permissão de exportar. Se for esse o caso, entramos em um mundo novo e perigoso.”
O acordo de compartilhamento de receita é a mais recente intervenção governamental agressiva e juridicamente questionável desde que Donald Trump voltou à Casa Branca em janeiro. Além de uma campanha tarifária caótica e críticas persistentes ao presidente do Federal Reserve, Trump tem usado sua plataforma no Truth Social para tudo, desde pedir a renúncia de CEOs até comentar campanhas publicitárias corporativas.
A abordagem transacional do presidente já havia sido vista quando ele aprovou a venda da United States Steel Corp. para a japonesa Nippon Steel Corp., em um negócio de US$ 14,1 bilhões que incluiu condições como adesão a regras de segurança nacional e concessão de uma “golden share” ao governo americano. Japão, Coreia do Sul e União Europeia prometeram investir bilhões de dólares nos EUA em troca de tarifas limitadas a 15%, enquanto empresas como a Apple Inc. escaparam de tarifas ao se comprometer a investir centenas de bilhões no país.
Segundo Deborah Elms, chefe de política comercial da Hinrich Foundation em Cingapura, os acordos com a Nvidia e a AMD podem levar a Casa Branca a mirar outros setores e produtos. “O céu é o limite”, disse ela. “Você pode imaginar todo tipo de combinação específica por empresa ou por país, dizendo: ‘Ninguém mais pode comercializar, mas se nos pagar diretamente, aí você pode’.”
Apesar de Nvidia e AMD terem aceitado os termos, há dúvidas sobre a legalidade do arranjo, que se assemelha a um imposto sobre exportação — algo proibido pela Constituição dos EUA.
Risco de grande depressão
O governo Trump, diz a Bloomberg, “já enfrenta um processo relacionado ao uso da Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional para impor o que chamou de tarifas “recíprocas” ao mundo. Na sexta-feira, Trump alertou para uma “GRANDE DEPRESSÃO” caso os tribunais considerem suas tarifas ilegais.
Os chips estão no centro da disputa entre EUA e China pelo domínio de indústrias do futuro, como inteligência artificial e automação. O governo Biden havia restringido a venda de chips avançados para a China, levando a Nvidia a criar o H20 para contornar essas barreiras. Em abril, autoridades de Trump endureceram os controles, proibindo a venda sem licença.
No mês passado, porém, a Casa Branca decidiu permitir que Nvidia e AMD retomassem as vendas de chips projetados especificamente para o mercado chinês — modelos menos avançados do que os aceleradores de IA de ponta. O secretário de Comércio, Howard Lutnick, afirmou que a intenção era deixar os desenvolvedores chineses “viciados” em tecnologia americana.
A China reagiu mal, especialmente após os EUA exigirem que os chips fossem equipados com tecnologia de rastreamento para reforçar os controles de exportação. No domingo, a conta Yuyuantantian, ligada à rede estatal CCTV e usada para sinalizar o posicionamento de Pequim, criticou publicamente as supostas falhas de segurança e a ineficiência do H20.
Ainda assim, empresas chinesas podem recorrer ao H20, já que a produção local não é suficiente para atender à demanda — o que pode beneficiar Nvidia e AMD e, agora, gerar receita extra para o governo americano.
Trump ainda não prorrogou a trégua comercial de 90 dias entre EUA e China, que expira em 12 de agosto. Lutnick afirmou na semana passada que o cessar-fogo “provavelmente” será mantido enquanto as maiores economias do mundo seguem negociando, com a possibilidade de um encontro entre Trump e Xi Jinping ainda este ano.
Embora os EUA já tenham intervindo antes — inclusive assumindo participações em empresas privadas após a crise de 2008 —, um acordo semelhante ao fechado com Nvidia e AMD é difícil de lembrar e, sem supervisão adequada, pode levar a um “estado de capitalismo de compadrio”, alertou Scott Kennedy, do Center for Strategic and International Studies, em Washington.
“Isso representa uma mudança enorme na forma como a economia americana deve funcionar”, disse Kennedy. “O que estamos vendo é, na prática, a monetização da política comercial americana, na qual empresas dos EUA precisam pagar ao governo para ter permissão de exportar. Se for esse o caso, entramos em um mundo novo e perigoso.”
Guerra cambial
Para defender o dólar como moeda preferencial nas trocas comerciais e nas reservas cambiais dos bancos centrais, Trump não tem medido nem intervenções no mercado futuros de ouro, que hoje tiveram queda de 2,50%. Para a Bloomberg, “Trump planeja provocar uma “guerra cambial” no mundo por meio de juros baixos nos EUA. Talvez não seja uma batalha via câmbio semelhante ao que se viu pós-crise de 2008 - mas sim a de 1929. Até porque o tripé que ainda sustenta a superioridade dos EUA só tem mais uma perna: a militar. E a Grande Depressão foi o marco do período Entre Guerras”.