
O OUTRO LADO DA MOEDA
Trump, o grande ditador, ataca o Pix
Publicado em 16/07/2025 às 18:46
Alterado em 17/07/2025 às 00:34

.
Já tinha dito, semana passada, que o comportamento autoritário de Donald Trump pede nova edição de “O Grande Ditador”, do genial Charles Chaplin, que satirizava, em 1939, o ditador nazista Adolf Hitler em guerra contra o mundo. A guerra de Donald Trump – entre uma superbomba e outra despejada sobre o Irã, fora os armamentos que entrega a Israel e à Ucrânia -, era, basicamente, de tarifas comerciais. Mas ele agora escalou querendo retaliar o Brasil por criar o Pix, sistema de pagamentos automático em vigor desde 2020.
A confissão de que se considera dono do mundo foi feita às claras perante a imprensa de todo o mundo, ontem à tarde, nos jardins da Casa Branca. Indagado por que queria investigar, com base nos regulamentos do USTR (O escritório de comércio internacional dos Estados Unidos) não só supostas “práticas comerciais desleais” do Brasil contra exportadores americanos, e incluir o Pix, o sistema de pagamentos automático brasileiro e os mercados de revenda de produtos contrabandeados ou pirateados, como o da 25 de março, perguntado por uma jornalista brasileira por que estava mirando no Brasil, Trump falou agressivamente: “Porque eu posso”.
O sr Donald Trump não é o dono do mundo nem pode passar por cima das regras da Organização das Nações Unidas e da agência que cuida das pendências comerciais: a Organização Mundial de Comércio. A OMC surgiu nos anos 80 em substituição ao Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt na sigla em inglês) para ajustar-se à nova realidade da economia mundial, com o crescimento da importância dos setores de serviços sobre as atividades da agricultura e da indústria, incluindo atividades extrativas.
Foto: Reuters
Em termos práticos, como a globalização, empreendida pelas multinacionais americanas que foram buscar mercados onde pudessem produzir a custos mais baixos (como na Ásia, em especial na China), gerou grandes déficits comerciais, estes não importavam tanto aos EUA. Desde que os ganhos em serviços (financeiros, em seguros, em câmbio, em patentes e royalties por aluguéis de equipamentos, incluindo a tecnologia da informação) fossem favoráveis aos EUA, e regulados pela OMC.
Mas os Estados Unidos de Trump estão desconsiderando as regras da ONU, da OMC, da OMS e outras agências. A mira do Pix (um sistema de pagamentos automático que o Federal Reserve vem estudando para os EUA, mas ainda não adotou) vem da pressão indireta de gigantes como a Meta, a Western Union (que faz remessas internacionais, as empresas de cartão de crédito (Visa, MasterdCard e American Express, entre outras) porque seu negócios (cartões de débito e de crédito perderam renda com a concorrência do Pix, que transfere recursos sem ônus.
O caso do Pix é mais uma intromissão em questões domésticas brasileiras. Os estudos para a adoção de um sistema de pagamentos instantâneo no Brasil, repetindo o que já existia em Portugal, Espanha, Japão, Indonésia, Vietnã e mais 50 países, foram iniciados em 2016 pelo Banco Central e o sistema entrou no ar em novembro de 2020, no governo Bolsonaro. Foi fundamental para a movimentação de recursos sem necessidade dos riscos de presença nas agências bancárias na pandemia da Covid-19.
O sucesso é tal que a Meta, de Mark Zuckerberg, queria operar um sistema de transferência automática, atrelado ao WhatsApp. Entretanto, não queria submeter o sistema às leis e à fiscalização soberana das autoridades brasileiras (como ocorre na União Europeia). Isso se mistura à falsa narrativa de que o Judiciário está querendo tutelar a liberdade de expressão no Brasil.
Juro é o problema no Raio X do Tesouro
Na sexta edição do Relatório de Projeções Fiscais (RPF), apresentado nesta quarta-feira, 16 de julho, pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), com as projeções das finanças públicas até 2035, fica claro que o calcanhar de Aquiles das finanças públicas brasileiras é o alto nível das taxas de juros.
O próprio RPF frisa que “devido ao nível mais alto dos juros nominais [a taxa Selic que baliza a dívida pública subiu de 10,50% em junho do ano passado para 15% ao ano e cada um ponto de aumento na Selic impacta a dívida em + R$ 56,8 bilhões ao fim de 12 meses] e do déficit primário [receita menos despesas, sem considerar os juros da dívida], a relação entre a Dívida Bruta do Governo Geral (BGG)/PIB deve registrar aumento de 2,5 p.p. do PIB em 2025 em comparação com 2024 [de 76,5% em 2024 para 79% do PIB este ano], mesmo, “com o desempenho do PIB freando esse aumento observa o texto”.
Como na velha querela do que veio antes – o ovo ou a galinha (a dívida é a saída dos governos para cobrir os déficits (sobretudo da Previdência Social). A alta dos juros reais (acima da inflação) tem sido crescente. Em 2025 os juros nominais vão subir de 8,1% do PIB (em 2024) para 8,5%.
Essa variação de 0,4 pontos de percentagem exige esforço extra no ajuste das finanças públicas (receitas menos despesas). Ano passado as receitas cresceram 18,4% em relação ao PIB e as despesas 18,8%, com déficit primário de 0,4%. Em 2025, o RPF prevê que as receitas atinjam 18,5% do PIB, com as receitas estáveis em 18,8%. Ou seja, o déficit primário encolhe para 0,3% do PIB, mas as despesas com juros vão a 0,4% do PIB, engolindo todo o esforço.
Mas o relatório é otimista com as projeções futuras e credita a confiança à reforma tributária, que entra em vigor em 2027 e às medidas de ajuste entre despesas e receitas uma melhora do cenário. A meu ver, discutível, face ao impasse do IOF, parcialmente compensado pelo desenho imposto pelo relator do Projeto de Lei de isenção do IR, deputado Arthur Lira. Lira manteve 100% de isenção do IR, a partir de 2026, mas ampliou o horizonte da isenção de R$ 7.000 mensais para R$ 7.350. e propõe a isenção de IR nos dividendos acumulados a 31 de dezembro deste ano no limite de renda mensal que superar os R$ 50 mil mensais, sujeito a tributação compensatória de 10%. Ainda não se sabe o efeito líquido nas receitas.
No cenário de referência, a despesa primária parte de 18,8% do PIB em 2025 e reduz-se até atingir 16,3% do PIB em 2035. Essa redução da despesa se dá de maneira mais acentuada a partir de 2027, quando a totalidade das despesas com precatórios é incluída no limite de despesas, mas, a partir de 2029, tal redução é parcialmente compensada pelo impacto dos fundos da reforma tributária, não sujeitos ao limite de despesas e cujo efeito foi incluído no RPF.
O estudo prevê um cenário otimista, com crescimento médio real do PIB (2025- 2035) de 2,7% ao ano, aumento nominal médio da massa salarial de 8,1% ao ano e redução da taxa Selic até 2031 e posterior estabilização em 6,4% a.a. As despesas obrigatórias sujeitas ao limite de despesa teriam crescimento real médio de 2,9% a.a. entre 2025 e 2035, com destaque para a evolução crescente das despesas com benefícios previdenciários do Regime Geral de Previdência Social, Benefício de Prestação Continuada, sentenças judiciais de custeio e capital e das despesas associadas aos mínimos de saúde e educação. Como reflexo desse crescimento médio maior do que o limite superior permitido pelo RFS (2,5%), as despesas discricionárias se reduzem no horizonte de projeção. Essa redução ganha tração a partir de 2027, com a inclusão da totalidade dos precatórios no limite de despesas.
Nota: O resultado primário é apresentado pelo conceito “acima da linha”, mais relevante para a discussão dos seus componentes e os eventos fiscais tratados neste relatório, enquanto o resultado nominal é apresentado pelo conceito “abaixo da linha”, pois é o mais adequado para confrontar com as estatísticas fiscais relativas à dívida pública.