
O OUTRO LADO DA MOEDA
IOF: governo busca no STF o que é seu
Publicado em 01/07/2025 às 17:29
Alterado em 01/07/2025 às 17:29

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Como sempre defendemos aqui, a prerrogativa de alterar as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sempre foi do Poder Executivo. Em meus 53 anos de cobertura econômica, as decisões sobre IOF eram do Conselho Monetário Nacional (presidido pelo ministro da Fazenda ou da Economia). Desde que não ultrapassado o teto e cumprido a carência mínima para a vigência na nova alíquota, o governo tem todo o direito de alterar o IOF.
O caso presente, diante da escalada dos juros da taxa Selic (remunerador de maior parte da dívida pública federal e piso do mercado financeiro), que saltou de 10,50% em maio de 2024 para 15% ao ano, em junho deste ano, transferindo mais renda para o setor financeiro e os rentistas, o governo decidiu que era adequado, do ponto de vista macroeconômico e da justiça tributária, buscar de volta parte do acréscimo de juros à renda dos rentistas via IOF.
Só o último aumento de 0,25% na Selic vai transferir mais de R$ 14,2 bilhões em 12 meses para os rentistas. Esse era exatamente a previsão máxima de arrecadação do IOF este ano. Segundo os cálculos do Banco Central, com base nos dados da dívida pública liquida de R$ 7,5 trilhões em 31 de maio, cada aumento de um ponto na Selic gera ônus de R$ 56,8 bilhões.
O aumento de 4,5 pontos na Selic em um ano vai transferir mais de R$ 255 bilhões aos rentistas nos próximos 12 meses. Isso agrava o rombo do Tesouro e cria sérios embaraços fiscais para o governo Lula no ano eleitoral de 2026, privado dos recursos do IOF e de outras medidas fiscais compensatórias à isenção do IR até os 10 milhões que ganham cinco salários-mínimos.
Câmara quis trocar IOF pela anistia
Num viés extremado inaugurado pela atual legislatura do Congresso, na qual a oposição, liderada pelo PL, tentou colocar como prioridade (votar, em regime de urgência) o Projeto de Lei de anistia para os envolvidos no 8 de janeiro, cujo objetivo principal era evitar penalização do ex-presidente Jair Bolsonaro e seus 33 companheiros denunciados pela Procuradoria Geral da República na trama dos atentados contra o Estado Democrático de Direito.
O líder do PL na Câmara, o pastor evangélico Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ) obteve, inicialmente, assinaturas de vários líderes evangélicos de outros partidos (até 2024, Sóstenes era o líder da chamada “bancada evangélica). Mas o governo pressionou os representantes dos partidos com presença no Ministério e muitas assinaturas foram retiradas.
Então, Sóstenes tentou trancar a pauta de medidas do governo. E aprovou o PL do PL, em “regime de urgência”. Teve de respeitar a fila de urgência para dezenas de outros projetos. Então voltou a tentativa de barrar as votações. Por fim, coube ao líder do PL liderar o movimento da Câmara pela derrubada do IOF. Conseguiu 383 votos (a maior parte dos votantes o fez pelo celular, diante do Plenário da Câmara) número suficiente para votar matérias constitucionais.
O próximo passo da oposição, que tem pressa, pois o julgamento do STF segue sem delongas, seria tentar um acordão em troca das negociações para a sustentação fiscal do governo. Para cortar essa via, o governo recorreu pela Advocacia Geral da União, em ato Declaratório ao Supremo Tribunal Federal, para que o STF diga se o Executivo violou algum preceito Constitucional ao elevar as alíquotas do IOF e propor IR de 5% sobre LCAs e LCIs em 2026.
Quem apostou na Argentina se deu mal
Esta coluna não tem memória curta. Muito ao contrário. Por isso, quando a revista “The Economist” faz uma crítica pesada ao governo Lula por condenar “veementemente” os ataques dos Estados Unidos às instalações nucleares do Irã – que violam a Carta das Nações Unidas, como sublinhou o Secretário-Geral da ONU, Antônio Guterres – sem ter feito o mesmo em relação à invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022, comete um erro gravíssimo de cronologia a respeitada revista britânica.
Até 30 de dezembro de 2022, o Brasil era governado por Jair Bolsonaro. Lula só tomou posse em 1º de janeiro de 2023, imprimindo uma nova diretriz ao Itamaraty, que se tornou “pária” na gestão do chanceler Ernesto Araújo. Lula retoma a política externa independente, que se tornou uma tradição brasileira desde o governo Geisel, em 1974. E Lula voltou a buscar o protagonismo do Brasil nos fóruns internacionais, como o G-20, os Brics e a COP-30.
Agora, no terreno econômico a mesma “Economist”, como de resto a imprensa americana, rasgou elogios à política de Javier Milei para a Argentina. Os leitores que acompanham essa coluna devem recordar que sempre duvidei da eficácia dos planos do presidente argentino para recuperar os tempos de glória da economia portenha. E meu principal argumento era a pequena escala do PIB dos nossos vizinhos (equivalente ao PIB de Minas Gerais).
Pois bem, após um “brilhareco” no ano passado (Milei, tomou posse em 10 de dezembro de 2023), com a liberação do câmbio e medidas drásticas que só agravaram o estado de pobreza da maioria dos argentinos, o peso argentino fechou o primeiro semestre como uma das moedas mais desvalorizadas do mundo (-14,41%). Já o índice Merval, que mede o desempenho das principais empresas negociadas na Bolsa de Buenos Aires, teve queda de 21,77%.
Enquanto isso, o real ganhava 4,09% em um ano e 13,36% no primeiro semestre. O Ibovespa, por sua vez, valorizou 15,44% de janeiro a junho. Ou seja, o ganho do investidor em dólar foi de 31,2%!
Quem atrapalha o quê, para onde?
Diante deste cenário, é absolutamente incompreensível a declaração de Matheus Spiess, tido como analista da Empiricus Research: "O que atrapalha o desempenho do real é o próprio Brasil. O contexto político e fiscal de Brasília continua trazendo dor de cabeça". Dor de cabeça para quem apostou contra o real e o Brasil?, pergunto eu.
Mas ele emenda, criticando as idas e vindas do IOF, segundo o site da “InfoMoney”: “Isso traz volatilidade aos ativos brasileiros, traz volatilidade para o câmbio". Quem opera com câmbio deve estar sujeito a chuvas e trovoadas.
Lembro apenas que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já puniu várias vezes analistas da Empiricus por não serem reconhecidos com agentes credenciados de investimento. Apenas comentaristas. Como este colunista.