O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

Como Trump afeta o PIB e a inflação

Publicado em 30/04/2025 às 12:17

Alterado em 30/04/2025 às 12:17

Nos 100 dias do governo Trump, com reações para baixo no dólar e nos preços de commodities, ainda não aliviaram a inflação no Brasil, avalia a LCA Consultores em sua atualização do cenário. Os mercados financeiros globais ensaiaram alguma estabilização ao longo dos últimos dias, com as bolsas de valores chegando a recuperar parte das perdas acumuladas desde o anúncio do "tarifaço" dos EUA. A ligeira melhora no humor dos mercados ocorreu na esteira de recuos (ainda que parciais) de Donald Trump em algumas de suas políticas e declarações controversas.

Esses desenvolvimentos reafirmam a expectativa da LCA de que recuos negociados nos aumentos tarifários acabarão por reduzir o choque provocado pelo "tarifaço", evitando uma recessão nos EUA e no mundo. Mas isso não significa que as incertezas (e os riscos) no ambiente internacional refluíram de maneira consistente. Incerto também é o alcance dos estragos já provocados pelo anúncio do "tarifaço".

A expectativa de que as tarifas seriam majoradas provocou um forte aumento nas importações dos EUA até março, o que deverá resultar num resultado negativo para o PIB dos EUA no 1º trimestre. Já neste 2º trimestre, a julgar por diversas sondagens econômicas, os demais componentes da demanda, como o consumo das famílias e o investimento, podem estar registrando um esfriamento abrupto. Mesmo que a incerteza comercial venha a refluir nos próximos meses, limitando o risco de recessão, o anúncio ruidoso do aumento de tarifas dificilmente deixará de impactar a atividade econômica no curto prazo.

No Brasil, o câmbio continua a sofrer gradativa descompressão - o que, junto com o recuo nos preços de commodities, como o petróleo, é fator de contenção de custos na cadeia produtiva. Isso vem ao encontro da avaliação de que o efeito líquido do choque tarifário global para o Brasil deverá ser algo desinflacionário.

Inflação e desemprego são a chave

Mas a LCA destaca que os indicadores mais recentes da inflação doméstica ainda não permitem afirmar que essa avaliação está se confirmando. O IGP-M de abril veio mais salgado do que o previsto, com taxas surpreendentes tanto no atacado industrial como, principalmente, no atacado agropecuário. Os resultados mais recentes da inflação no atacado sugerem que a hipótese de que o ambiente externo se tornará desinflacionário ainda guarda elevada incerteza. Assim como segue incerta, a reboque, a perspectiva de moderação da inflação ao consumidor e das expectativas inflacionárias.

As medidas de tendência da inflação ao consumidor continuam a mostrar resiliência e a correr em níveis incompatíveis com as metas; e a média das projeções para a inflação de 2026 superou o teto da meta de 4,5%.

Selic sobe até 15% em junho

Neste cenário, a consultoria segue avaliando que o ciclo de aperto monetário contará com ajustes adicionais da taxa básica Selic, que deverá ser levada a 15% ao ano até junho e mantida neste patamar até o 1º trimestre de 2026.

Para a consultoria, a possibilidade de que o ciclo seja interrompido com a Selic em patamar um pouco mais baixo e/ou que a política monetária comece a ser flexibilizada ainda neste ano, desdobramento que uma parte dos mercados parece começar a aventar, só passará a preponderar caso a atividade econômica e o mercado de trabalho (o desemprego subiu para 7% em março) comecem a mostrar sinais mais claros de esfriamento no Brasil.

Escolhas com o calendário político

Mas isso entra em choque com o calendário político. Em busca da reeleição, o presidente Lula precisa fazer uma escolha de Sofia: aceita um crescimento menor e um leve aumento do desemprego agora para a inflação ser domada na virada do ano, ou vai ter sobressaltos em 2026. Ele tem um grande trunfo: a isenção do IR para quem ganha acima de R$ 5 mil mensais em 2026, o que beneficiaria 10 milhões de eleitores, e a maior tributação sobre os super ricos.

Em 2022, Bolsonaro, atormentado pela inflação, fez o diabo em matéria de políticas distributivas para aliciar o eleitor (aumentou o Auxílio Emergencial para R$ 600 e ampliou o número de participantes individuais, deu mesadas a caminhoneiros e motoristas de taxi e isentou impostos de jet skis importados).

Sem poder conter a inflação (a guerra da Rússia na Ucrânia explodiu os preços dos combustíveis e alimentos), demitiu dois presidentes da Petrobras (o problema era o PPI, arquivado por Lula) e cortou os impostos federais e estaduais de combustíveis energia elétrica e comunicações. Não adiantou. A inflação ainda estourou o teto da meta (era de 5,50%, deu 5,79%) e Lula foi eleito. Inconformado, Bolsonaro costeou o alambrado do golpe e virou réu.

Contas fiscais melhoram, sem os juros

Com boa parte dos gastos do Orçamento de 2025 trancados porque o congresso não tinha aprovado o OGU 2025, o setor público consolidado teve superávit primário (receitas menos despesas, sem contar os juros da dívida pública) de R$ 3,6 bilhões em março, (+ R$ 1,2 bilhão em março de 2024). O governo central e as empresas estatais tiveram déficits de R$ 2,3 bilhões e R$ 566 milhões, mas os governos regionais, superávit de R$6,5 bilhões. Em 12 meses, o setor público consolidado teve déficit de R$ 13,5 bilhões, 0,11% do PIB, ante déficit de R$15,9 bilhões, 0,13% do PIB, acumulado até fevereiro.

O problema é que os juros nominais do setor público consolidado, apropriados por competência, somaram R$ 75,2 bilhões em março de 2025, contra R$ 64,2 bilhões em março de 2024. Em 12 meses, os juros nominais somaram R$ 935,0 bilhões (7,80% do PIB) em março contra R$ 745,7 bilhões (6,71% do PIB) em 12 meses até março de 2024.

Incluindo os juros, o resultado nominal do setor público consolidado, foi deficitário em R$ 71,6 bilhões em março. Em 12 meses, o déficit nominal alcançou R$ 948,5 bilhões (7,92% do PIB), ante déficit nominal de R$ 939,8 bilhões (7,91% do PIB) em fevereiro de 2025.

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