
O OUTRO LADO DA MOEDA
LCA defende corte maior da Selic; BC reage
Publicado em 22/11/2023 às 17:21
Alterado em 22/11/2023 às 17:21
Os fatos estão mostrando – pelo andar da inflação, que caminha para ficar abaixo do teto da meta de 2023 e 2014, e a forte desaceleração da economia – que o nível da taxa Selic (que serve de piso às operações do mercado financeiro) está muito alto. Sobretudo quando o Fed e o BCE deram uma parada na escalada dos juros do dólar e do euro.
Até o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, reconheceu nesta 4ª feira, em palestra na Câmara para a Frente Parlamentar para o Livre Mercado, que a taxa básica ficou "bastante alta". Mas, querendo eximir o BC do erro de ter superestimado o efeito inflacionário da reoneração (a partir de 1º de janeiro) dos impostos federais e estaduais cortados por Bolsonaro de julho a dezembro de 2022 – Lula só iniciou a reoneração, escalonada, em março) e de ter subestimado o impacto deflacionário nos alimentos da supersafra de grãos), justificou-se que “foi o patamar necessário para estabilizar esse processo".
Campos Neto quis atribuir ao Comitê de Política Monetária do Banco Central o mérito de queda da inflação que não cabe ao Copom. Além dos fatos citados, não se deve esquecer a contribuição deflacionária do “abrasileiramento” dos preços dos combustíveis domésticos pela Petrobras, que abandonou o PPI. Ao alinhar os preços internos às cotações internacionais e à variação do dólar, o PPI forçava a Petrobras a ceder espaço ao mercado para importar combustíveis. Agora, usa a vantagem comparativa do baixo preço de extração do petróleo mais leve do pré-sal para refino em suas refinarias. O PPI era parte do processo de dieta da Petrobras visando sua privatização.
A alta prolongada dos juros, mais do que derrubar a inflação – que jamais passou de 6% em 12 meses em 2023, mas, de acordo com a taxa Selic, calibrada em 13,75% de 3 de agosto de 2022 a 2 de agosto de 2023, era estimada em dois dígitos pelo Copom – derrubou foi a economia, como mostram todos os indicadores do PIB, como o IBC-Br (a prévia do PIB do BC, que caiu 0,64% no 3º trimestre.
LCA defende urgência de cortes na Selic
No boletim de análise conjuntural que distribuiu ontem à noite, já analisando a Ata do Fed, que “manteve tom neutro, compatível com encerramento do ciclo de altas de juros” (posição reforçada pelo Depec do Bradesco, que espera estabilidade até o início de novo ciclo de cortes, em meados de 2024), e o impacto da eleição de Javier Milei, na Argentina, a LCA Consultores vê com preocupação o fato de a economia brasileira vir “perdendo fôlego (com a inflação convergindo em direção às metas), já considerando improvável um crescimento de 3% no PIB deste ano.
A LCA observa que a revisão das Contas Nacionais de 2021 trouxe uma revisão para baixo no peso da atividade agropecuária na composição do PIB. “Como o setor vem liderando o crescimento neste ano, a redução de seu peso na composição do PIB [sempre achei exagerado o alarde de que o agronegócio, incluindo o que saída das fazendas e mais a movimentação, estocagem, transformação na agroindústria e o consumo final ou a exportação, representava 24,5% do PIB], isso, “por si só, tenderia a resultar em pequena revisão para baixo, de cerca de 0,2 ponto percentual, no PIB” de 2023.
Diante da influência indireta da movimentação da safra agrícola (com estimativa de expansão quase zero em 2024, devido aos impactos climáticos), os efeitos benéficos na indústria e nos serviços serão quase nulos em 2024.
Por isso, com o PIB esfriando e a inflação sob controle (e sinais de estabilidade nos preços internacionais), a consultoria vislumbra uma janela de oportunidade para que o Banco Central promova uma normalização monetária mais célere. A desaceleração, já ameaça revisões para baixo no PIB de 2024 (que a LCA estima ter crescimento 50% menor que os propalados 3% de 2023.
Campos Neto mantém ritmo
Mas em entrevista à TV Bloomberg, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, destacou que é apropriada a continuidade do ritmo de corte de 50 pontos base nas próximas duas reuniões do Copom. Como juros estão são bem restritivos e a inflação em queda existe espaço para a continuidade da flexibilização da política monetária. Novamente, Campos não sinalizou a extensão desse ciclo por conta de diversos fatores de incerteza, como problemas geopolíticos, os preços do petróleo, entre outros.
Isso lembra a história de João e Maria, capturados pela Bruxa, que ouvia de minha avó Beatriz quando criança. Ardilosamente, Joãozinho a empurra para o caldeirão (preparado para os irmãos) e, enquanto ela gritava “água, meus netinhos”, eles replicavam: “azeite, minha avozinha”. Estamos como os irmãos caídos na panela e a Bruxa (BC) não alivia nem o fogo nem o azeite.
A próxima reunião do Copom é em 12 e 13 de dezembro. Uma semana antes (5 de dezembro) o IBGE divulga o tamanho da queda do PIB no 3º trimestre.
O enigma da BR-381
Privatizar coisas rentáveis e que pedem baixa manutenção é moleza. Sempre há interessados a pagar ágios. Mas a história ensinou que um empreendimento com déficit crônico enquanto estatal, melhora em eficiência quando privatizado, mas segue sem boas perspectivas quando privatizado.
O caso mais notório foi a antiga Telemar, privatizada, como, as demais teles, em 1998. A antiga telefonia fixa de ia de Minas, RJ, ES até os estados do NE e NO, foi a única sem disputa e sem ágio (o maior foi a compra da Telesp pela Telefónica de Espanha). Pois a Telemar, endividada logo se fundiu à Oi a empresa de telefonia móvel do mesmo (menos endividada). Adotou seu nome, mas acabou rateada entre as três grandes operadoras sobreviventes ao processo de concentração pós privatização: Claro, Vivo e Tim.
Nas privatizações de rodovias ou ferrovias, sempre as que cortaram os planaltos do Paraná, São Paulo, o Triângulo Mineiro e o Planalto Central, saíram mais fáceis e tiveram disputas que geraram ágios para o Estado.
Quando os traçados de modernização envolviam regiões montanhosas, que pediam caras obras de arte (túneis, pontes e viadutos, bem mais custosos que a simples movimentação de terras entre uma colina de terras e um vale (a ser preenchido com o desmanche da primeira), raramente havia disputa.
Vejam três casos clássicos:
A duplicação da BR-101 (a Rio-Santos, que jamais ficou pronta) nunca teve interessados. Sua construção, margeando o oceano, nos anos 70, abriu espaço à especulação imobiliária na Costa Verde (RJ) e Litoral Norte de SP). Em meio século a estrada não mudou. A última tentativa do ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, Tarciso de Freitas, atual governador de São Paulo, misturou a nova concessão da Via Dutra (BR-116 Rio-São Paulo) à duplicação da BR-101. Passados 12 meses não há canteiros de empreiteiras no litoral.
Outro calcanhar de Aquiles é a duplicação na BR-116 na saída de São Paulo para o Paraná, na Serra do Café (restrições ambientais e custosos túneis e viadutos deixam o trecho como um dos mais perigosos do país.
A mais difícil
Mas o troféu segue com a BR-381, que viria do Centro-Oeste (MS) e cortaria Minas Gerais e o Espírito Santo até Vitória. Depois de duas tentativas fracassadas, desde 2013, quando Tarciso assumiu o DNIT para fazer uma “faxina” no governo Dilma, a concessão fracassa por falta de interessados. Tarciso, ministro, incluiu o trecho plano do Triângulo e a BR-262/ES para atrair empreiteiras. Em vão. As serras de Minas e Vitória desestimulam os lances.
Pois na 1ª tentativa de leilão do governo Lula não houve interessados ontem, mesmo com o governo excluindo a BR 262 do caderno de encargos. Os motivos são os de sempre (custos altos que deixam o retorno mais incerto com as altas taxas de juros praticadas pelo BC). Nada de desconfiança a Lula.