O Outro Lado da Moeda

Por Gilberto Menezes Côrtes

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O OUTRO LADO DA MOEDA

BC erra em 3 meses este ano; acertará em 2022?

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Publicado em 30/09/2021 às 20:09

Alterado em 01/10/2021 às 19:08

Gilberto Menezes Cortes CPDOC JB

O Banco Central divulga ao final de cada trimestre, o Relatório Trimestral de Inflação. Elaborado pela Diretoria de Política Econômica, traz previsões sobre inflação, mercado de trabalho, atividades econômicas, crédito e as contas externas para o trimestre seguinte e dois ou três anos adiante.

No RTI divulgado hoje, 30 de setembro, pelo diretor Fabio Kanczuk, em entrevista que contou com a presença do presidente do Banco Central, Roberto de Oliveira Campos Neto, o BC previu que o Produto Interno Bruto (PIB) deste ano crescerá 4,7% e o de 2022 terá avanço de 2,1% sobre o de 2021.

No mesmo elenco de previsões, o BC estima que a inflação deste ano termine em 8,5% (estourando largamente a meta de inflação, que é de 3,75%) e a de 2022 fique em 3,7%, ainda dentro do limite superior do centro da meta de de 3,50% (com tolerância de 1,5 ponto percentual).

As projeções do Banco Central, sobretudo as de 2022 causaram perplexidade no mercado porque, diante do risco cada vez maior de restrições de oferta de energia em 2022, projeta-se desaceleração ainda maior da economia.

Comungo da perplexidade e ponho em larga dúvida a capacidade de acerto do BC ante seu retrospecto recente. No RTI do 2º trimestre, divulgado em 28 de junho, o BC previa que a inflação 12 meses medida pelo IPCA (que alcançara 8,1% em maio) chegaria a 8% em setembro (foi a 9,68% em agosto e o próprio BC estima que irá a 10,2% - o IBGE divulga o número em 98 de outubro). Um desvio de 2,2 pontos percentuais, ou 27,5% em três meses, é um erro bárbaro.

Erro colossal nas Contas Externas

Mas o que dizer do erro também colossal das previsões das contas externas? No RTI de junho, o BC previu que as Transações Correntes (Balança comercial + transações de serviços e as contas de juros e renda) fechariam 2021 com superávit de US$ 3 bilhões. Depois de déficit de US$ 26 bilhões em 2020, seria uma recuperação extraordinária.

Isso se deveria ao saldo de US$ 70 bilhões esperado para a Balança Comercial (mais do que dobrando o saldo de US$ 32 bilhões do ano passado). Só que três meses depois os técnicos do BC viram que falharam nas previsões. Em vez deste saldo vigoroso, a balança comercial teria superávit de US$ 43 bilhões. A redução ocorreria porque, apesar das projeções para as exportações subirem dos US$ 280 bilhões previstos em junho para US$ 282 bilhões, as importações cresceriam de US$ 210 bilhões para US$ 239 bilhões (puxada por gastos com petróleo e combustíveis).

E o ingresso de Investimentos Diretos Estrangeiros encolherá de US$ 60 bilhões para US$ 55 bilhões. Um dos fatores da deterioração é preocupante: a redução dos empréstimos intercompanhias (de matrizes para filiais no Brasil) ganhou velocidade muito acima do esperado (parte pelo diferencial de juros que está se estreitando, em parte pelo sentimento de perda de perspectiva de crescimento das atividades das filiais no país).

Para ficar marcado: para 2022, o BC projeta déficit de US$ 14 bilhões nas Transações Correntes (redução de 33%), com saldo de US$ 60 bilhões na balança comercial e ingresso de US$ 60 bilhões em IDP.

Itaú diverge com elegância

Nenhuma previsão é tão otimista quanto as do BC para o PIB e a inflação, para as quais não achei explicações razoáveis e embasadas em indícios firmes. O Departamento Econômico do Itaú prevê inflação de 4,2% em 2022 em cenário de restrição de 5% na oferta de energia, com o PIB avançando só 0,5%. Com redução de 10% na oferta, o PIB encolheria 1,5% e o IPCA iria a 5,7%.

O JP Morgan está projetando avanço de 0,9% para o PIB do próximo ano, a MB Associados prevê 0,4%. A LCA Consultores, próximo do otimismo do Banco Central, prevê que o PIB cresça 4,8% este ano e 1,7% em 2022, com IPCA, respectivamente, de 8,5% e 4,5%. (O Bradesco deve divulgar nos próximos dias a sua revisão para baixo do PIB e para cima da Selic e IPCA).

Em nota, o Depec Itaú comentou com elegância (sem minha contundência) o RTI: “ O relatório de inflação de setembro de 2021 mostra projeções consistentes, a nosso ver, com a continuidade do processo de aperto da política monetária, com novas altas de juros à frente. O ritmo de elevação, que projetamos ser de 1,00-1,00-0,75 p.p. nas reuniões de outubro, dezembro e fevereiro, respectivamente, seguirá dependente da evolução do cenário e, em particular, das expectativas para o IPCA em 2022”.

“Vale destacar que a projeção do BCB para a inflação acumulada no primeiro trimestre de 2022 se situa abaixo da nossa estimativa e do consenso de mercado. Nesse sentindo, é possível que surpresas altistas com relação ao cenário da autoridade monetária no início do ano afetem as perspectivas para o fim do ciclo de elevação de juros”.

“Entre os estudos apresentados, destacamos o boxe que analisa a evolução das expectativas de inflação e conclui que, apesar do nível atual ser elevada, as expectativas para os próximos anos se mantêm relativamente próximas à meta (ao contrário do que se observou no período de inflação alta entre 2010-15). O BCB afirma que isso é algo significativo à luz do ambiente atual, que é desafiador para a condução da política monetária – e que tal condução se deu em linha com o que se espera de um regime de metas de inflação, com decisões que foram em boa medida previsíveis e contribuíram para a gestão das expectativas de inflação”.

O Itaú chegou a cobrar a divulgação ainda ontem de uma errata do boxe, anunciada pelo presidente Roberto Campos Neto. [Ela foi feita na própria divulgação do RTI na internet].

“Outro boxe interessante investiga os baixos níveis de estoques e elevada utilização de capacidade na indústria, que resultam da escassez de matéria prima e aquecimento da demanda, e pressionam os preços de produtos industriais. O estudo aponta que o potencial rebalanceamento do consumo das famílias em direção a mais serviços e menos bens tende a contribuir para o reequilíbrio entre oferta e demanda”.

“Por outro lado, o BCB afirma que parte dos setores afetados pela escassez de insumos (em particular, o automobilístico) devem ter normalização de oferta apenas em 2022, com potencial, portanto de que esse continue sendo um fator de pressão ao longo dos próximos meses”, sintetiza o Itaú.

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