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A chama futurística de Flying Lotus

Reprodução -
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Quando entrevistei em novembro do ano passado a maior lenda viva do jazz mundial, Mr. Herbie Hancock, na sua ultima passagem pelo Brasil, uma das perguntas que mais aguçava minha curiosidade eram suas impressões sobre o jazz atual e as referências que iriam liderar o futuro do gênero musical. Historicamente essa pergunta tem um significado especial, pois Herbie Hancock, assim como Miles Davis, foram músicos que inovaram na fusão do jazz com outros gêneros como o Rock, o Funk, R&B e até a musica Latina. Sem pestanejar, Hancock respondeu: “Flying Lotus é um dos grandes nomes do futuro da musica, e tem minha total admiração “.

Como um amante do jazz tradicional (mas que não fecha os olhos para os novos sons e tendências), confesso que Flying Lotus não era o nome que ocuparia o topo das minhas preferencias. Nomes como Kamasi Washington, Thundercat, Robert Glasper (que estará no Brasil na próxima semana) entre outros, fariam mais sentido na minha avaliação. Porem, quem sou eu para discordar de Herbie Hancock? Sai da entrevista disposto a conhecer mais sobre o produtor musical de apenas 35 anos, nascido na Califórnia e fundador da gravadora Brainfeeder, admirado por músicos, artistas e diretores do alto escalão do “Showbusiness”.

Macaque in the trees
(Foto: Reprodução)

Para minha felicidade, soube que Flying Lotus (ou Steven Elisson, seu nome de batismo) lançaria no primeiro semestre desse ano um novo disco. Era a chance de apurar melhor seu trabalho e entender os caminhos que o levaram a um patamar tão alto apesar da pouca idade. Lançado na ultima sexta-feira, “Flamagra”(Warp Records) é o sexto álbum de estúdio do produtor, que não lançava um disco novo desde 2014 com “You’re Dead” , também pela Warp Records. As (pasmem) 27 faixas trazem um variado e complexo repertório, que incluem participações que vão do premiado diretor cinematográfico David Lynch ao rapper Anderson Paak, além de George Clinton, Little Dragon, Tierra Whack, Denzel Curry, Shabazz Palaces, Thundercat, Toro y Moi e Solange.

Lotus contou que havia reunido material diferente dos últimos cinco anos no processo de criação do disco, e teve uma idéia temática ao ouvir David Lynch (diretor e roteirista de filmes como “Cidade dos sonhos”, “Estrada perdida” e “Twin Peaks”) falando em uma festa que ele estava participando sobre como fazer um álbum com um conceito de fogo durante esse tempo. Ele imaginou a "chama eterna sobre uma colina" – relembra o produtor.

De fato, “Flamagra” traz em suas faixas um som futurista, admirado e explorado por Hancock, Miles e outros músicos do jazz como Wayne Shorter, Chick Corea, Jaco Pastorius etc. Seu funk-jazz arrebator e ilimitado na criatividade traz experiências incríveis, e outras ainda difíceis de interpretação. “Fire is coming”, que conta com vocal de Lynch, é dessas que abusa do lado inventivo do roteirista, com uma coleção de batistas e sintetizadores, que fogem muito ao conceito do Jazz. Jazz esse que acabou voltando, graças aos colaboradores de longa data, como os tecladistas Brandon Coleman, Dennis Hamm e Taylor Graves; o multi-instrumentista Miguel Atwood-Ferguson; e, especialmente, o baixista Stephen Bruner, mais conhecido como Thundercat, um membro-chave do cérebro do Brainfeeder e co-autor da maioria dessas músicas. “The Climb”e “Land of Honey” sinalizam na minha visão tendências do jazz com o groove certo, explorando os tons e a melodia do futuro, mas com a base e os solos que caracterizam o gênero milenar no ritmo adequado. Faixas como “Remind U” e “Say Something” também me agradam por explorar a criatividade aliada a tradição (essa ultima numa pegada Tom Waits para ninguém botar defeito).

Sua chama segue acesa em "Pilgrim Side Eye", uma miniatura de funk que fecha em seus segundos finais, em acordes lindos e suaves, vislumbra mudanças, mas com o virtuosismo canalizado na interação do grupo. Tipico de Mr Hancock não acham?

Os 67 minutos divididos na maioria em fachas de dois ou três minutos reforçam as bem-humoradas teorias que as habilidades sobre-humanas de Lotus em tecer elementos de jazz, eletrônica e hip-hop em arranjos que se misturam fazem dele um ser de outro mundo.

Se ainda não é possível comprovar a existência de vida fora do planeta terra, no planeta da musica podemos constatar que o som de Flying Lotus veio para mudar o rumo das coisas.

Se isso será bom, só o futuro vai dizer.

BEBOP

Robert Glasper in Rio

O premiado pianista, símbolo da nova geração do jazz, se apresenta na próxima terca-feira, as 20 hrs no Teatro Municipal, com seu eletric trio, além do Dj Sundance.

Dianne Reeves

Ainda na pegada internacional, a cantora jazzística Dianne Reeves se presenta no dia 15 de Junho, com o guitarrista Romero Lubambo, no Blue Note Rio, em dois sets, as 20 e 22:30 hrs.

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coluna | jazz