Por Coisas da Política

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COISAS DA POLÍTICA

Tempo frio na Malásia

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Publicado em 21/10/2025 às 06:05

Alterado em 21/10/2025 às 21:39

Lula e Trump Fotos: reproduções

Até que ponto, pergunta-se, as boas relações entre a Casa Branca e o presidente brasileiro ajudariam a robustecer o discurso de Lula, como candidato a um novo mandato? Ajudariam em nada, mas com certeza complicariam sua imagem junto às esquerdas, que aqui, mais que em qualquer outro lugar, contestam tudo que Trump fala e faz. O que permite supor, na avaliação pragmática de quem vai correr atrás de votos, que melhor para a campanha é manter as distâncias em nome de patriótica autonomia; e o anunciado encontro na exótica Malásia ficaria por conta de protocolos, formalidades e suaves tapinhas nas costas. Na essência, poucos proveitos.

Candidato estimulado pelas pesquisas, que o têm na conta de competitivo, o que Lula deseja e precisa é consolidar as forças que define como progressistas e antiamericanistas, objetivo que se torna mais evidente, quando o quadro eleitoral vem se construindo em bases cada vez mais intolerantes e radicalizadas. Se a candidatura dependesse da direita, e dela está longe, os afagos de Trump teriam grande utilidade. Mas não é o caso.

Uma certa dúvida quanto à badalada “química” bilateral e as reais expectativas desse próximo encontro justifica-se no desinteresse de Brasília em aplainar os caminhos ideológicos que levam a Washington, o que seria útil para ampliar espaço a um diálogo produtivo. Pois bem, no momento em que o chanceler brasileiro Mauro Vieira enfrentava a franqueza fria do colega Marco Rubio, nos quinze minutos de conversa no Departamento de Estado, Lula discursava no congresso do Partido Comunista, onde execrou as atuais ameaças dos Estados Unidos sobre a Venezuela, e proclamou a América Latina como terra impermeável a impertinências de “presidentes de fora”. Palco e plateia comunistas para um recado que não podia ter endereço mais claro. Em Caracas, o ditador Maduro celebrou a reação brasileira como apoio político e estratégico, o que o habilita a contar com outros gestos simpáticos, caso as coisas se compliquem. Certamente haveriam de se complicar também para nós.

Mais que sabido, o abismo nas relações ampliou-se com a sobretaxação com que o presidente americano castigou as exportações brasileiras, sem esconder que se tratava de uma ação política, depois que o Departamento de Estado considerou que vivemos sob ditadura disfarçada, na qual Executivo e Judiciário se consorciaram contra o Congresso. Não é só. Quando chegar o momento do tête-à-tête na Malásia, se chegar, os dois presidentes terão antiga pauta a distanciá-los, não só a Venezuela, mas também Israel, Irã e Ucrânia, além dessa tese que tanto nos interessa: a sobretaxas escandalosa tem tudo a ver com política. Visto assim, uma dose de otimismo para o encontro Trump-Lula parece coisa muito minguada.

(Melhor é manter essa reunião em fogo brando. Surgiram indícios de que o governo americano prepara uma nova carga de restrições, o que incluiria aplicar sanções a ministros e personalidades influentes de Brasília. Se tais incursões, como se teme, afetarem as funções da embaixada, a conversa fica muito difícil; talvez nem possa se realizar).

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