COISAS DA POLÍTICA

Uma semana que nos antecipa o ano de 2026

...

Publicado em 12/10/2025 às 08:10

Alterado em 12/10/2025 às 08:10

Sessão na Câmara que derrubou a MP de taxação dos mais ricos e das casas de apostas; Hugo Motta na liderança Foto: Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados

Ainda me recuperando de uma pequena cirurgia na mão esquerda, não resisti de comentar os acontecimentos desta semana marcante, que anteciparam, no Brasil e no mundo, boa parte do calendário do ano eleitoral de 2026. Nos Estados Unidos, a eleição de meio do ano decide quem controla o Congresso; no Brasil, decide-se se Lula ganha um quarto mandato ou se o poder ficará com a oposição. A surpresa veio na manhã de segunda-feira, 6 de outubro, com o telefonema de Trump a Lula. A química de 30 segundos na Assembleia da ONU, três semanas antes, em setembro, durou meia hora. Lula pediu a revogação do tarifaço (sobretudo o aumento de 40% às exportações brasileiras em agosto). Trump, que gostou da conversa, designou o secretário de Estado, Marco Rubio, para conduzir as negociações com o Brasil.

Surpresa com a mudança de cenário, a oposição chegou a comemorar o “golaço” da indicação de Marco Rubio, pois vêm do departamento de Estado as maiores sanções ao Brasil, instigadas pelo filho 03, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), e o economista Paulo Figueiredo, neto do último ditador brasileiro, general João Figueiredo. Essa narrativa embalou o reagrupamento das tropas da oposição para impor uma derrota ao governo, quando a MP 1.303, que aumentava a taxação das bets, das “fintechs” e bancos, e fechava alguns canais de elisão fiscal e de concentração de renda decorrentes da escalada dos juros para conter a especulação com o dólar no segundo semestre do ano passado, ia ser votada na quarta-feira, 8 de outubro.

Para evitar que as digitais dos políticos que fariam a opção preferencial pelos ricos e rentistas fossem identificadas, a oposição ligou o modo “quanto pior, melhor” e retirou a MP de pauta, antes da votação. O governo perdeu R$ 45 bilhões que estavam previstos com a nova tributação este ano e no ano eleitoral de 2026. Como uma pedra atirada num lago calmo que vai provocando ondas, o mercado financeiro operou quinta e sexta-feira com o dólar pressionado, com certos exageros de analistas alardeando o descontrole fiscal.

Era uma reprise de 2024. No segundo semestre o dólar subiu mais de 10%. Quando bateu o recorde de R$ 6,3144, em meados de dezembro, o Banco Central continuou a elevar os juros e o maior diferencial com os juros pagos nos EUA atraiu o “turismo” especulativo de investidores estrangeiros (inclusive brasileiros situados em paraísos fiscais). As cotações vieram caindo até 15% no final do mês passado, mas o ataque especulativo da oposição, cujo objetivo – como disse na GloboNews, em debate na terça-feira à noite, o líder do PL no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ) - era evitar dar recursos aos programas sociais que fortaleceriam o cacife eleitoral de Lula em 2026, deixou claro qual era a estratégia. Portinho ainda desembrulhou, à frente do senador Renan Calheiros (MDB-AL), que a segunda parte do plano, se a oposição não saísse vitoriosa no pleito presidencial em outubro de 2026, seria garantir ampla maioria de senadores eleitos pela direita e o “Centrão”, para aplicar “impeachments” a ministros do Supremo Tribunal Federal e ao próprio governo.

Por isso, enquanto a oposição ficava atônita com a evolução do diálogo Brasil-EUA, na quinta-feira, 9 de outubro, era vez de Marco Rubio ligar para seu equivalente em responsabilidade nas relações exteriores, o chanceler Mauro Vieira. A conversa civilizada entre os representantes das duas maiores democracias do Ocidente abriu espaço para a organização de agenda de interesses para negociação em uma próxima reunião entre representantes dos dois governos, em Washington. Mas o mercado financeiro não perdeu tempo de apenas comemorar a isenção de tributos no topo da pirâmide quando a MP caiu. Tratou de espalhar, novamente, cenário de pânico na área fiscal, como se o governo não fosse capaz de encontrar saídas. O efeito foi fazer o dólar subir 2,50% na sexta-feira e acumular alta de 3% na semana.

A última do Tarcísio
Apressado come cru, diz o ditado. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que, já disse aqui, parece o jóquei cujo cavalo está tão tinindo nos cascos para a corrida presidencial no ano que vem – embora não tenha vestido a jaqueta do dono do estúdio, o ex-presidente Jair Bolsonaro – pode cair do cavalo no alinhamento para o “starting gate”. Ele vem colecionando gafes seguidas. Vale recordar que celebrou o tarifaço de Trump e até usou o boné MAGA para comemorar a medida contrária aos interesses da economia paulista e do Brasil (empresários e trabalhadores). Quando tentou se corrigir, o estrago estava feito. Se Trump baixar as tarifas, como pediu Lula, será outro enorme revés.

Na investigação da atuação do PCC na execução do ex-delegado geral de Polícia Civil, Ruy Ferraz Fontes, dia 15 de setembro, em Praia Grande (SP), pisou na bola. Depois, no caso das contaminações de bebidas alcóolicas com metanol no Estado, antes que alguém perguntasse, foi logo excluindo o PCC de suspeita. E ainda deu um “replay” do famoso meme de Bolsonaro que desdenhou das mortes por Covid-19, em 2020: “E daí, não sou coveiro”, disse o então presidente. Tarcísio, diante do aumento crescente de contaminados no estado mais populoso do país, disparou: “Só vou me preocupar quando falsificarem a Coca-Cola”, sua bebida predileta.

Na batalha da tributação das bets, “fintechs” e bancos e as aplicações dos mais ricos, ficou com o andar de cima e a Faria Lima. A última oportunidade para manter a boca fechada foi jogada pela janela na sexta-feira, quando comemorou a escolha da candidata derrotada por Nicolás Maduro nas fraudulentas eleições de 2024, na Venezuela, Maria Corina Machado, como Prêmio Nobel da Paz em 2025.

O prêmio era cobiçado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que esperava que suas ações para o cessar-fogo entre Israel e o Hamas, na Faixa de Gaza, se juntassem a seus esforços para interromper conflitos no Oriente Médio (o ataque às instalações nucleares do Irã abriu espaço para uma trégua entre o país dos aiatolás e Israel, com mediação de países árabes que apoiaram o acordo de paz entre judeus e palestinos), na Ásia (entre Paquistão e Índia e Tailândia e Camboja), na África (entre a República Democrática do Congo e Ruanda, e entre Egito e Etiópia pela disputa do uso da água do Nilo). Trump queria ser o quinto presidente americano nomeado (o último foi Barack Obama), alegando impedir uma guerra entre a Sérvia e o Kosovo e ainda entre a Armênia e o Azerbaijão. Faltou o progresso entre Rússia e Ucrânia.

A escolha de Maria Corina não só frustrou a Trump, como deve ter criado mais restrições dele ao secretário de Estado, Marco Rubio. O filho de exilados cubanos (ainda nos tempos do ditador Fulgêncio Batista, derrubado pela revolução de Fidel Castro, em 1959) foi um forte cabo-eleitoral da escolha da venezuelana por um júri dominado por cubanos-americanos e que dá nítida preferência na América Latina a signatários da direita local à Carta de Madri, de 2020, como Maria Corina, do Chile e da Colômbia. Na direita brasileira, assinou Eduardo Bolsonaro. Na Espanha, a articulação foi do direitista Vox.

Como se vê, Tarcísio de Freitas está igual biruta de aeroporto. Mal capta a direção do vento, faz escolhas erradas. Trump, um anti-imigrante, queria comemorar o Nobel da Paz na festa do “SuperBowl” americano, na California. A láurea foi a uma “cucaracha”, e ainda terá de ouvir o “show” do porto riquenho Bad Bunny. A frustração de Trump levou-o a ameaçar a China com tarifas de até 100%. Será trágico, se não for cômico, para a direita brasileira, se Trump, que teme o impacto das altas da carne e café na vida dos americanos, não obrigar Rubio a desembrulhar o pacote anti-Brasil, feito com ajuda do 03.

Quem indicar para o STF?
O que se depreende da emoção do ministro Luís Roberto Barroso, ao anunciar, quinta-feira, 9 de outubro, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, sua saída da Suprema Corte, oito anos antes do término do mandato, é que não foram poucas nem leves as pressões que sofreu, com sua família, nos dois anos em que presidiu o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de maio de 2020 a fevereiro de 2022 e depois presidiu a STF de 28 de setembro de 2023 a 29 de setembro de 2025, período de julgamento dos acusados da tentativa golpista de 2022, que resultou no 8 de janeiro de 2023.

Por sua firme atuação no TSE, combatendo as desinformações sobre as urnas eletrônicas (para eliminar desconfianças chamou representantes das Forças Armadas para a comissão de estudos e sugestões ao aperfeiçoamento do processo eleitoral, que culminou com o relatório do Exército que não encontrou uniformidades, mereceu o ódio dos bolsonaristas. Mas as maiores reações que o tornaram o mais odiado do STF, depois de Alexandre de Moraes, foram duas declarações: em palestra numa faculdade de direito, após as eleições de outubro de 2022, deixou escapar um “derrotamos [a sociedade] o bolsonarismo”. O ódio triplicou quando foi hostilizado por um bolsonarista em Nova Iorque e exclamou, na virada do ano de 2023: “Perdeu, mané”. As perseguições se materializaram nas sanções do governo americano à Suprema Corte, que presidiu até duas semanas, e lhe atingiram pessoalmente e ao filho advogado que atua nos EUA e que teve, também, o visto cassado.

O dilema de Lula
Lula só esperava indicar um novo ministro para o STF, se for reeleito no ano que vem, em abril de 2028, quando o ministro Luiz Fux completa 75 anos. Depois, em abril de 2029, seria a aposentadoria da ministra Carmem Lúcia, o único voto feminino na Suprema Corte. Com a oposição ensarilhando armas, Lula precisa se fortalecer no STF, e a escolha mais lógica seria um auxiliar de confiança, o Advogado Geral da União, Jorge Messias. Filiado no PT e evangélico, pode criar pontes com o eleitorado conservador, arredio a Lula.

Mas a disposição belicosa da oposição no Senado, onde o governo corre o risco de ser minoria em 2026, o que aumentaria as pressões por “impeachment” no STF e no Executivo, pode recomendar a indicação do ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que conta com o apoio do atual presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre.

A sociedade pode clamar ainda pela indicação de uma juíza, mas o tempo é dos guerreiros.

Deixe seu comentário