
Por Coisas da Política
WILSON CID - [email protected]
COISAS DA POLÍTICA
A ficção partidária
Publicado em 12/08/2025 às 11:21
Alterado em 12/08/2025 às 11:21

Na mesma direção do que pensam pessoas responsáveis, o presidente Lula desencantou-se com os partidos, teoricamente definidos como organizações de representação política. Foi o que deixou claro em recente pronunciamento na capital peruana. Já não servem para nada. Uma queixa, apenas com roupagem de desabafo, porque ele não tem o que fazer para desanuviar esse cenário, que há muito passou a ser preocupação dos estudiosos da política, que sabem, ante numerosos exemplos, que as legendas acabaram reduzidas a grupos de interesses ou motivações nem sempre recomendáveis. Perderam o significado e o significante, abandonaram compromissos mínimos quanto ao conteúdo e à capacidade de levantar ideias e propor as coisas que a sociedade deles espera.
A decepção presidencial faz sentido, porque, logo após, ficou sabendo que algumas parcelas da base de apoio ao seu governo já avaliam o momento mais adequado, ou menos impróprio, para se despedirem da fidelidade. Outra coisa não foi o que se ouviu de expressões parlamentares do União Brasil, que tem participação expressiva no governo, detendo três ministérios. Se a questão limita-se a saber qual o momento propício para o desembarque, demonstrado fica que o apoio da bancada no Congresso, quando oferecido – nunca completo e incondicional – nada mais terá sido que uma adesão ocasional. E, se vai chegando a hora de o governo se testar, tentando a reeleição do presidente, todas as conversas e acordos anteriores vão para as calendas, mesmo que o noticiário dê conta de que a ideia do abandono não goza de unanimidade naquele e em outros grupos, animados com a busca de novos rumos.
Fica o presidente com dificuldade para recompor a base de apoio, pois quem permanecer e os que vão chegar têm a mesma voracidade. Nada mais almejam que não um poderoso escudo para enfrentar as urnas de 26. Também acenam com vida efêmera, venham de onde vier. Para Lula, chegada a campanha eleitoral, sua ou de outro candidato que o represente, as legendas podem condená-lo a esse problema, que já tirou o sono de muitos de seus antecessores, mas nenhum deles com envergadura para mudar o rumo dessa lamentável história de permuta de conveniências. Até mesmo no partido in pectore, PT, ele sabe que há colaboradores que se mantêm nos postos por amor orgânico e sobrevivência.
2 – Quem o ouviu afirmar, num recente encontro partidário, que o melhor para o país é caminhar rumo ao socialismo, deve saber que também aí reside enorme dificuldade. Com que socialistas Lula espera contar para a grande reviravolta? O partido que levanta essa bandeira, PSB, com raros idealistas sinceros, tem sua expressão maior no ministro Geraldo Alckmin. Mas não há alquimia capaz de transformá-lo em vigoroso defensor da quebra das estruturas capitalistas, nas quais, certamente, repousam suas convicções. Melhor seria o presidente não enveredar mais profundamente nesse propósito. Se não por outros motivos, para não acentuar as atuais divergências políticas, econômicas e ideológicas com o governo dos Estados Unidos e seus aliados, que não querem saber de socialismo; e geralmente declaram como adversários os que pensam diferentemente.
Na atualidade, os partidos são isso. Total inautenticidade, sem programas bem definidos. Os nomes que adotam, se tanto, apenas pretendem atrair simpatias populares.
3 - Nas eleições processadas a partir de 2022, vários deles se voltaram para a novidade das federações, que se inspirariam no desejo de fortalecer os programas. Uma balela, quando se sabe que o real objetivo era, e é, salvar da decapitação as legendas nanicas, esquálidas, oportunistas de época de eleição, quando alugam ou vendem seus preciosos segundos de propaganda na televisão.
Na semana passada, uma das sessões plenárias do Supremo Tribunal Federal cuidou dessas federações, as existentes e as que almejam organizar-se, todas já com apetite para bons acordos no ano eleitoral. Saíram abençoadas rumo à proliferação. Só não se deu por unanimidade, por causa do voto virtual discordante do ministro Toffoli. Todos ficaram devendo argumentos sólidos para que os brasileiros possam ver nessas federações um ânimo novo na estrutura partidária, cada vez mais repleta de defeitos e vícios, envelhecidos do berço do bipartidarismo, que já não funcionava a contento.
4 - Se o presidente tem dificuldades para se cercar de partidos que pensem no governo, antes de pensar apenas nos planos eleitorais, fato constatável é que não está sozinho ante tal desafio. Porque outras lideranças, governistas e oposicionistas, trabalham num campo de ficções. Os nossos dias comprovam que são uma ficção. Navegam com as velas pandas de interesses ocasionais ou circunstanciais. Nessa aventura, Lula não escapa de conviver com falsas alianças, porque, sabe muito bem, ruim com elas, pior sem elas.