
Por Coisas da Política
GILBERTO MENEZES CÔRTES - [email protected]
COISAS DA POLÍTICA
Tornozeleira visa parar o crime de lesa-pátria
Publicado em 20/07/2025 às 08:35
Alterado em 20/07/2025 às 08:47

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Que fique bem claro: o uso de tornozeleira eletrônica pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, determinado na sexta-feira, 18 de julho, pelo ministro Alexandre Moraes, não é uma antecipação de sua provável condenação por liderar a ação golpista que culminou com a invasão e depredação das sedes dos três Poderes, em 8 de janeiro de 2023. Relator no Supremo Tribunal Federal (STF) do julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus pelos crimes de conspiração golpista contra o Estado Democrático de Direito, Moraes mandou a Polícia Federal investigar as ações de Bolsonaro e seu filho, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-RJ), para induzir o governo Trump a interferir no julgamento em curso, com a chantagem da ameaça de tarifas de 50% contra as exportações brasileiras a partir de 1º de agosto.
Ou seja, agora são três situações contra o ex-presidente tramitando no Judiciário. Jair Messias Bolsonaro já foi condenado e considerado inelegível até 2030 pelo Tribunal Superior Eleitoral, em 30 de junho de 2023. E está sendo julgado na Ação Penal 2.668 (denúncia do golpe) com outros 33 acusados, dos quais oito, incluindo generais quatro estrelas, fariam parte do núcleo do golpe. Depois, houve a manifesta interferência do deputado, que pediu licença de 120 dias (expira neste domingo, 20 de julho) para atuar nos subterrâneos do governo Trump a fim de sancionar o relator do processo, o ministro Alexandre de Moraes. Mas Eduardo, que já pleiteou ser embaixador do Brasil nos Estados Unidos em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro e quando Donald Trump estava em seu primeiro mandato, não passa de aprendiz de feiticeiro. Sua magia junto à MAGA virou um tiro pela culatra.
Ignorando a soberania entre os três Poderes, o presidente dos Estados Unidos tomou a defesa de Jair Bolsonaro como uma causa pessoal e, se imiscuindo nos assuntos internos do Brasil, exigiu "imediatamente" (em letras maiúsculas) que o presidente Lula interrompa as ações contra Bolsonaro, sob a ameaça de impor tarifaço de 50% sobre todas as exportações brasileiras aos EUA. Trump usou o argumento mentiroso de que o Brasil causa, “por práticas desleais de comércio”, grande déficit aos Estados Unidos [em15 anos, desde 2009, a balança comercial é negativa para o Brasil, que acumula déficit de US$ 410 bilhões com os EUA]. A ameaça de Trump provocou revolta dos empresários, trabalhadores e da opinião pública em defesa da soberania nacional (estimativas dos maiores bancos brasileiros projetam perdas comerciais de dezenas de bilhões de dólares e desemprego de mais de 150 mil trabalhadores) com a afronta às instituições brasileiras.
Pela declaração dos membros do clã Bolsonaro condicionando a suspensão das barreiras tarifárias à anistia a Jair Bolsonaro e demais acusados que ainda nem tiveram o julgamento concluído, para forçar o governo Lula a interferir no Judiciário, o relator do processo das ações golpistas, o ministro Alexandre de Moraes, determinou à Polícia Federal a instauração do inquérito 4.995/DF para investigar as ações de Eduardo Bolsonaro – devidamente bancadas nos EUA com a transferência de R$ 2 milhões, via Pix, confessada pelo pai. (Bolsonaro arrecadou R$ 17 milhões em 2024 com contribuições de apoiadores, via Pix, para "custear advogados"). A remessa foi considerada como uma interferência direta do clã Bolsonaro para atrapalhar o andamento da Ação Penal. Como o Judiciário – bem como o Legislativo – entraria em recesso sexta-feira, 18 de julho, o ministro Moraes determinou o uso de tornozeleira eletrônica por parte de Jair Messias Bolsonaro, para ser monitorado 24 horas, e outras medidas cautelares. Com o passaporte retido, Bolsonaro deve cumprir prisão domiciliar (ficar em casa das 18 horas até o amanhecer), está proibido de ter contato com o filho Eduardo, de acessar mídias sociais e de se aproximar de embaixadas estrangeiras.
A nova acusação
O inquérito 4.995 deve resultar na acusação de “coação no curso do processo e tentativa de obstrução de Justiça". Mas o mais grave é o crime de “atentado à soberania”. Trata-se de uma acusação inédita para Bolsonaro, e por ironia foi o próprio ex-presidente quem sancionou a lei que incluiu a tipificação no Código Penal, em 2021. No artigo 359-I do texto, classifica-se como atentado à soberania a atitude de “negociar com governo ou grupo estrangeiro, ou seus agentes, com o fim de provocar atos típicos de guerra contra o país ou invadi-lo”. A pena prevista é de reclusão de três a oito anos. Um crime de lesa-pátria.
Os Bolsonaros, patriotas do pau-oco, alheios aos prejuízos à nação, aos empresários e trabalhadores, assim como o pai só tratava a força terrestre como “o meu Exército”, julgam que podem agora induzir o presidente Trump - como num jogo de pôquer, no qual se renovam as apostas - a triplicar as ameaças comerciais contra o Brasil, que já incluem o Pix, na retaliação à medida cautelar de monitorar os passos de Jair Bolsonaro para não interferir no processo.
Seria mais irônico ainda se, no bojo das acusações que o USTR (o escritório de comércio dos Estados Unidos) arrola para investigar o Pix - o sistema de transferência eletrônica criado pelo Banco Central em 2020, no governo Bolsonaro (repetindo o que já fazem cerca de 50 países) - por suposta concorrência desleal contra bandeiras de cartões de crédito e débito dos EUA (Visa, Mastercard e American Express, e a Western Union, em transferências internacionais), houvesse o estorno de muitas operações. Imagine o que diria o clã Bolsonaro se o botim dos R$ 17 milhões "doados" ao pai fosse parcialmente confiscado pelo governo Trump. Seria atitude imperial como a imposição de tarifas de 50%. A Redecard, do espanhol Santander, de Ana Botin, não reclamou.
Vitória com derrota do Brasil
Os Bolsonaro saborearam uma pequena vitória na noite de sexta-feira, quando o secretário de Estado dos Estados Unidos, o republicano Marco Rubio, anunciou nas redes sociais (os grandes jornais dos EUA não noticiaram) ter determinado a revogação dos vistos americanos do ministro Alexandre de Moraes, familiares e “aliados no tribunal”. Numa agressão à soberania nacional do Poder Judiciário, a suspensão de vistos seria estendida ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, e aos ministros Dias Toffoli, Cristiano Zanin, Flavio Dino, Carmen Lúcia, Edson Fachin e Gilmar Mendes. Como a Suprema Corte é composta de 11 membros, divididos em duas turmas, a rigor ficaria de fora das sanções, na Primeira Turma, que está julgando a ação do golpe, apenas o ministro Luís Fux (ele integra a turma, presidida por Cristiano Zanin, junto com Carmen Lúcia, Flavio Dino, Gilmar Mendes e o relator do caso, Alexandre de Moraes). Na Segunda Turma, os isentos de qualquer sanção seriam os dois ministros nomeados por Jair Bolsonaro, Cássio Nunes Marques e André Mendonça.
Essa era, originalmente, como reconheceu Eduardo Bolsonaro, a sanção pela qual batalhou nos Estados Unidos. Mas o aprendiz de feiticeiro só conseguiu seu intento depois que o presidente Donald Trump, numa agressão à soberania do Brasil, ameaçou o país com tarifas de 50% nas exportações, se não parasse “IMEDIATAMENTE” as ações contra Jair Bolsonaro. Todo o episódio de chantagem do clã Bolsonaro gerou forte reação em defesa dos interesses nacionais, ameaçados como moeda de troca numa hipotética anistia para Bolsonaro, que desgastou a direita e favoreceu o presidente Lula. A ação do Secretário de Estado norte-americano, Marco Rubio, contra Moraes e mais de dois terços do STF, só ocorreu depois que Moraes impôs restrições à circulação, com tornozeleira eletrônica, do ex-presidente, e o proibiu de continuar trocando informações com o filho 03 para interferir no julgamento em curso. Alheio aos bilionários prejuízos dos empresários nas exportações aos EUA, o deputado licenciado declarou em redes sociais que se considerava vingado pela sanção a Alexandre de Moraes e demais ministros, pela “humilhação" ao pai.
E o Brasil, ó!
A última do Congresso antes do recesso.
Em todo o mundo, a começar pelo Reino Unido, onde a Carta Magna definiu, no século 13, a criação do Parlamento (então Câmara dos Lordes, ou senhores de terras) para frear a sanha de gastos do Rei, a ser coberta com mais impostos, além de votar leis, os deputados e senadores, eleitos para o Legislativo pelo cidadão/contribuinte/eleitor, têm como obrigação fiscalizar as ações do Executivo para impedir que o excesso de gastos resulte em mais impostos (para cobrir os gastos) ou no pior dos impostos indiretos – a inflação.
No penúltimo dia de atividades, antes do recesso de 18 de julho a 4 de agosto, o Senado escolheu uma comissão de senadores de variados partidos para ir aos EUA negociar com senadores americanos um nível menor nas tarifas às exportações. O time de parlamentares será coordenado por Nelsinho Trad (PSD-MS), presidente da Comissão de Relações Exteriores. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), entra como titular, acompanhado do líder do PT, Rogério Carvalho (PT-SE), que ocupa uma cadeira de suplente. Dois ex-ministros do governo Bolsonaro participarão das negociações: o astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e Tereza Cristina (PP-MS), ex-ministra da Agricultura.
Mas, enquanto o Senado se prepara para defender os interesses da Nação, os deputados aprontaram mais uma emboscada contra as finanças públicas, em represália ao veto do presidente Lula ao aumento de 18 cadeiras de deputados federais na legislatura de 2027 (eleição de 2026). O presidente da Câmara, o paraibano do Republicanos, Hugo Motta, que já comemorara com os conterrâneos a cadeira de mais um deputado (a representação aumentaria de oito para nove deputados federais), irritado com a decisão do presidente Lula, pautou uma proposta (aprovada) que onera em R$ 30 bilhões os gastos do Tesouro, com mais subsídios no crédito do agronegócio, com saques a fundos constitucionais federais.
Ou seja, o discurso que tenta forçar o governo a cortar gastos sociais para evitar aumento de impostos sobre os ricos, e que gerou a celeuma contra o IOF, é muito de autodefesa. Os parlamentares, com os benefícios indiretos, ganham bem mais que R$ 50 mil mensais, o limite acima do qual o governo propõe um aumento gradativo do Imposto de Renda das Pessoas Físicas até 10%, incluindo receitas de lucros e dividendos. Cortar gastos, só no bolso do eleitor.
O que dizem as pesquisas?
O caro leitor ou leitora que acompanha esta coluna já deve saber que dou valor relativo às pesquisas eleitorais muito antecipadas. Na última postagem sobre o assunto, dizia que só interessava aos governadores que não podem mais se candidatar à reeleição e queriam medir as chances de uma vice-presidência ou uma disputa ao Senado (duas vagas por estado em 2026). Pois bem: Lula, que parecia enfraquecido, deu a volta por cima, com as trapalhadas do “sequestro” do país pelo presidente Trump e a “famiglia” Bolsonaro.
Por isso mesmo, continua ainda muito cedo para juízos de valor mais sólidos. E cabe ressaltar que os bons resultados do governador do Paraná (Ratinho Jr, do PDS) podem ser atribuídos a entrevistados que imaginavam ser o pai, o popular apresentador do SBT, o candidato da planilha.