GENTE

Glórias eternas

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Por CAL GOMES

Publicado em 07/05/2025 às 18:46

Alterado em 07/05/2025 às 19:09

Da esquerda para a direita: Montenegro pintado de Botafogo; entre os filhos Bernardo, Marcelo e Carlos André; condecorado em um evento; e orgulhoso ao lado da estátua do Manequinho, em frente a sede do Botafogo Fotos: Divulgação e álbum de família

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Dos seus 71 anos completados em janeiro, 40 Carlos Augusto Montenegro esteve à frente do extinto Ibope, fundado em 1942, que foi vendido ao grupo americano Kantar em 2014 e que manteve a famosa marca até 2021, perto de completar 80 anos. Ou seja, mais da metade de sua vida o economista e executivo carioca viveu intensamente os movimentos do mundo político, eleitoral e de mercado quando assumiu, no início dos anos de 1980, a presidência do mais importante Instituto de pesquisas de opinião do país.

E nessas sete décadas de vida, em mais de seis Montenegro manteve a paixão pelo Botafogo batendo forte dentro do coração, clube carioca que começou a torcer aos sete anos incentivado pelos amiguinhos da escola, chegando ao seu ápice como torcedor e aficionado quando esteve na presidência do Glorioso de 1994 a 96, no comando da conquista do seu primeiro título de Campeão Brasileiro, em 1995.

Hoje, dedica grande parte do seu tempo a curtir a família e as caminhadas pela orla de Ipanema, onde eu o conheci, no início dos anos 2000, quando, pacientemente, parava para conversar sobre política e futebol. E foi quase como uma continuação daqueles "papos" nos quiosques que Montenegro falou ao JORNAL DO BRASIL, em uma longa entrevista exclusiva, sobre pesquisas de opinião, política, políticos, eleições, futebol, SAFs, CBF e, principalmente, Botafogo e Ibope, e suas Glórias Eternas.

 

JORNAL DO BRASIL: Durante 40 anos, você foi o presidente e a voz do Ibope que, nas oito décadas de existência, se consolidou como o maior e mais confiável instituto de pesquisas de opinião do país, tornando-se referência, símbolo e sinônimo de audiência. Como analisa o atual momento do setor?

Carlos Augusto Montenegro: O Ibope foi o primeiro instituto de pesquisas da América Latina que atuou nas áreas de audiência, de televisão e rádio, de política e pesquisa de mercado. No setor de pesquisa de audiência, televisão e rádio, principalmente televisão, durante muito tempo as TVs abertas eram as que precisavam dos dados de audiência. Então se media isso com os "aparelhinhos" [NR: dispositivo instalado nos televisores] ou com os pesquisadores batendo de porta em porta, nas casas, métodos conhecidos como "flagrantes". Com a evolução, hoje a televisão nas casas perdeu um pouco o sentido de algo domiciliar, familiar, porque com os surgimentos do celular, tablet, computador, com o sistema de streaming, com as plataformas novas que surgiram, tipo Youtube, Amazon Prime Video, Globo Play, Netflix etc, o conteúdo "ganhou pernas" e é visto em qualquer lugar: no trabalho, no carro, no ônibus, no metrô, em casa, cada um no seu quarto, e na hora que quiser. Não tem mais aquele negócio de "8 horas Jornal Nacional, 8:30 novela", dando isso como exemplo. Não tem mais isso. As pessoas assistem durante o dia ou na hora que quiserem. Com tudo isso, ficou muito difícil medir a audiência de TV principalmente.

As pesquisas de mercado continuam, mas muitas empresas agora já têm seus departamentos próprios e elas mesmas fazem.

Com relação à área política, com a polarização em todo o mundo muito forte atualmente, entre esquerda e direita, as pesquisas nas ruas estão tendo muitas dificuldades. Existem os eleitores que não gostam, que evitam dar entrevistas, e isso acaba distorcendo um pouco. Nas pesquisas por telefone também existem complicadores porque as pessoas não estão em casa, não podem falar pelo celular porque estão no trabalho. Durante a noite você só pode ir até uma determinada hora, para não incomodá-las. Enfim, eu acho que é um momento difícil que os institutos vão ter que se adaptar.

 

E durante os seus anos no Ibope você não enfrentou esses complicadores...

A família, eu, meus irmãos, filhos, resolvemos vender o IbopeE na hora certa, em 2014, principalmente a parte de mídia que significava quase 80% do nosso faturamento...e nós vendemos antes dessas grandes dificuldades aparecerem. Tenho muito orgulho do tempo em que a gente atuou. E durante estes 80 anos, metade disso, realmente, eu estive comandando. E também sinto muito orgulho quando o nome Ibope entrou nos dicionários brasileiros. Não só como uma empresa que realizava pesquisas - Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatísticas - mas a que também entrou no dicionário como sinônimo de sucesso, de êxito, de vitória, tipo: "Ëssa festa deu ibope...aquela reunião não deu ibope nenhum"; ou "Essa pessoa está com o ibope alto, essa está com o ibope baixo". Enfim, muito orgulho quando você entra no dicionário e o seu nome está lá como referência em pesquisa, principalmente no Brasil.

Neste longo período, por muitos anos, apenas o Ibope e o Gallup exerceram a atividade de pesquisa e análises de política e políticos. Depois, no início dos anos de 1990, o Datafolha iniciou participação nessa área. Hoje, existem, sem mais as presenças do Ibope e do grupo americano, pelo menos, seis Institutos ativamente no mercado. Acha saudável essa quantidade exercendo a função de pesquisas eleitorais?

Realmente, durante muito tempo, ficaram o Ibope e o Gallup, mas o Gallup saiu logo e o Datafolha veio a seguir. Eram os principais.

O Datafolha tem uma metodologia diferente da que a gente usava, que é a de pesquisar em pontos de fluxos de pessoas. Nós trabalhávamos mais nos quarteirões, prédios, nas casas, fazendo entrevistas domiciliares. Apesar das metodologias diferentes, os resultados sempre eram muito parecidos. A partir daí surgiram vários. Eu acho que a concorrência sempre é boa. O importante é que os institutos sejam, e acho até que são, em sua maioria, dirigidos por pessoas sérias, corretas, e entender que hoje uma amostra é uma coisa simples. Qualquer aluno, qualquer pessoa que estude estatística etc, pode fazer uma amostra. Acho que o knowhow do Ibope durante muito tempo foi a qualificação das pessoas que trabalhavam com pesquisas e a sensibilidade para colocar vários itens de checagem durante a seleção das pessoas e durante a fiscalização depois da entrevista. É fundamental o cuidado com o questionário que não pode, em nenhum momento, distorcer ou influenciar uma resposta do entrevistado.

Acho que os Institutos estão enfrentando essa polarização, principalmente no Brasil, entre direita e esquerda, e aí, dependendo do gosto do "freguês", eles evitam dar entrevistas, e quando a pessoa evita, seja de direita ou de esquerda, já se sabe que ela gosta de um candidato X, mas você não pode computar quando ela não aceita ser entrevistada porque não se tem os seus dados de qualificação. Pode-se saber, por exemplo, que é uma mulher, mais ou menos a idade, mas não sabe onde ela vota, não sabe o grau de instrução, não sabe uma série de coisas....Então não se pode incluí-la na pesquisa porque isso acabaria distorcendo um pouco o resultado. Está complicado... o mundo está um pouco complicado, mas os Institutos acabam encontrando uma solução.

 

Quase que rotineiramente os institutos estão medindo e informando índices coletados junto aos eleitores. Como você define essa estratégia que tem sofrido críticas de parte da mídia e da sociedade?

Na verdade, tem uns quatro Institutos que estão divulgando. Um deles é o Ipec, o outro é o Atlas, Paraná Pesquisas e o Datafolha, os que eu me lembro agora. A tendência é que cada um divulgue uma por mês até o ano que vem, quando teremos mais pesquisas. Agora você tem esses Institutos, cada um divulgando, praticamente, uma por mês, então temos uma por semana. É normal. Na verdade é para avaliação do governo Lula, que tem caído bastante. Aí vão começando a especular, colocar nomes de candidatos: "Se fosse esse, se fosse aquele, se fosse o outro". É normal. Para valer mesmo só depois das convenções dos partidos, quando se tem um quadro completo. Por exemplo: agora as pesquisas ficam desbalanceadas, às vezes colocam 4, 5 candidatos de centro-direita, contra apenas um de esquerda e a direita acaba se prejudicando porque dilui, se começa a mensurar isso em uma hipótese de segundo turno...mas é normal.

 

Em todos estes anos em que esteve à frente do Ibope, quais eleições em que os resultados finais mais te surpreenderam? E as que foram mais difíceis de se chegar a um número seguro de análise?

Foram muitas eleições difíceis. Quase todas são complicadas porque, na verdade, a pesquisa é uma "foto" de um momento, então a gente tenta ir até o final, mas quando se começa a pesquisar e a eleição é no domingo, e se iniciam as pesquisas na sexta-feira e elas vão até sábado e divulgam no sábado à noite, as perguntas, os questionários, as respostas de sexta-feira já estão defasadas porque podem surgir fatos novos na sexta à noite; no sábado de manhã, e a própria divulgação da pesquisa de quinta-feira acaba mexendo um pouco com a cabeça do eleitorado, dos indecisos principalmente.

Agora, a eleição de 1985 em Fortaleza, a que venceu a Maria Luiza Fontenelle, foi difícil e foi uma das primeiras vitórias do PT. Foi bastante complicada. Aconteceu um fato importante na época. Teve uma greve dos ônibus e mataram um sindicalista no meio dessa greve, faltando 4 dias para a eleição, em uma quinta-feira...e aí mudou tudo. E naquela época a gente teve uma outra eleição mais difícil em Recife e nós acabamos não acompanhando a de Fortaleza,  enviando dois pesquisadores para fazer a de Recife. Acabou que o Paes de Andrade, que estava bem na frente, perdeu para Maria Luiza. Acabamos acertando muito bem o resultado de Recife e não acertamos a de Fortaleza porque não fomos até o último instante. Aprendemos muito com essa situação.

A eleição do Collor também foi difícil porque o Brasil estava dividido. Em 1989, as capitais, regiões metropolitanas, estavam mais com Lula, e no interior, mais com o Collor. Várias eleições difíceis. Essa última, em 2022, foi bastante complicada porque ali já tinha os efeitos de direita X esquerda, de pessoas querendo agredir pesquisadores, se esquivando de dar respostas, e isso tumultuou o trabalho e tornou a situacão mais difícil...mas tivemos várias eleições complicadas.

 

E a eleição de Wilson Witzel em 2018, para o governo do Rio...o que aconteceu?

Foi uma onda que surgiu...uma onda bolsonarista. Nenhum dos candidatos que estavam colocados mereceu muita confiança do eleitor que estava "meio aéreo" durante a eleição. Além da onda bolsonarista, houve uma onda nas redes sociais do Witzel. Depois de uma Lava Jato etc, o termo "juiz" junto ao nome teve uma grande interferência: "Juiz Witzel". Então foi isso. Uma eleição que foi decidida em quatro, cinco dias, e as pesquisas acompanharam. É aquele negócio; pesquisas são fotografias de um determinado momento. Então veio o momento com muitos indecisos...e no final teve um debate e o eleitorado se decidiu por ele. Paciência. Algumas pesquisas detectaram isso, outras, não.

 

Com essa polarização, disputa acirrada da esquerda X direita, nas ruas, casas, trabalho, redes sociais, fazer a medição da preferência do eleitorado se torna mais difícil para os Institutos chegarem a números mais precisos?

Cada dia que passa, com todos esses fatores que você mencionou, polarização direita X esquerda, mais fake news, está cada vez mais complicado fazer pesquisas na rua. Alguns eleitores se esquivam; os de direita são rmais radicais, os de esquerda são mais maliciosos...então é complicado. Caminha uma solução talvez por telefone, mas aí você também tem uma série de dificuldades de pessoas que não podem atender durante o trabalho, ou que ainda não têm cadastros firmes de telefone celulares. Está mesmo complicado fazer pesquisa atualmente, mas sempre se encontra uma tendência. E é sempre bom.



Como analisa a provável candidatura do Presidente Lula para a reeleição? Acha que ele é o grande favorito às eleições de 2026?

O Ipec, onde eu estava lá com a Márcia Cavallari, e que agora foi comprado pela Ipsos, que é a protagonista muito forte no mercado mundial em pesquisas de opinião pública, realizou uma pergunta se acha que o Presidente Lula deveria ser candidato à reeleição, e quase que 2/3, 65 % por cento dos entrevistados, acham que não deveria. Isso é uma tendência das pessoas que acham que ele não deveria concorrer. Uma tendência de pessoas que não votariam nele. Seria difícil, se essa tendência continuar, ele chegar a um outro mandato.

Temos que partir do princípio que, atualmente, no mundo, há uma tendência de eleitorado caminhando para centro-direita. Acho que não houve uma renovação de ideias, de proposta das esquerdas e das centro-esquerdas...nem no mundo nem aqui. Penso que as eleições de 2026 vão ser muito complicadas. Nem sei se o Lula vai concorrer. Tanto Lula quanto o Bolsonaro são muito polêmicos e radicais nos seus pensamentos. O Bolsonaro está convalescendo de uma cirurgia muito complicada, muito invasiva. Além de estar inelegível. Eu não sei o que vai acontecer, mas acho difícil ele concorrer. Lula também. Ele não tem sucessor, não deixou herdeiro político. A esquerda não se renovou. São as mesmas figuras de sempre. Todo mundo meio que se segurando no Lula que tem também uma saúde meio debilitada e que para concorrer a um outro mandato sairia já com quase 86 anos e com a saúde não muito boa. Temos exemplos do que aconteceu com John Biden, nos EUA, que desistiu.

Minha opinião é que o Brasil está precisando de uma renovação tanto de centro, quanto de direita, de centro-direita, de centro esquerda, de esquerda. Talvez a gente em 2026 tenha uma chance de começar a votar novamente a favor de alguém, porque, ultimamente, nos últimos 10 anos, principalmente, as pessoas têm votado contra. Contra o PT, contra o Lula, contra Dilma ou contra a direita, contra o Bolsonaro: "Eu voto contra. Detesto o PT então vou votar contra ele..." E do outro lado acontece o mesmo: "Não interessa. Na direita eu não voto. Detesto o Bolsonaro. Vou votar contra. Não interessa.". Então o brasileiro está votando muito contra. Existe no mundo e no Brasil também um movimento caminhando para centro-direita. Se você notar as últimas eleições de governadores em 2022 e prefeitos em 2024, a centro-direita avançou muito no congresso, na câmara e no senado; avançou muito em governos estaduais. A esquerda ficou, nos estados, apenas com 2, 3 dos governos. Na centro-esquerda, em Recife...e na Bahia, Rio Grande do Norte e no Piauí com o PT. Então você pega a região sudeste, o sul, o centro-oeste e estados importantes do nordeste, a centro-direita prevaleceu. A tendência é que isso continue em 2026 e eu acho que um candidato da centro-direita, que não seja Bolsonaro, porque ele tem muita rejeição, por diversos motivos, teria muita chance de ganhar.

 

Se o Presidente Lula decidir não disputar as eleições, o nome da esquerda, quase que unânime, para substituí-lo é o do Ministro da Fazenda Fernando Haddad. Como você vê essa possibilidade?

O Haddad sempre vai ser um candidato, apesar de eu achar que ele está desgastado nesse governo como ministro da Fazenda. Houve aquela confusão da questão do PIX, da taxação das "blusinhas"...uma série de fatos que mostram que ele não está bem. Existem outros nomes...alguns falam no Camilo Santana, Ministro da Educação. Na verdade, é uma oportunidade, com todas essas dificuldades, a esquerda começar a pensar em uma renovação.

 

E os candidatos da direita?

O problema da direita já é outro. Também tem problemas. Apesar de eu achar que ela seja favorita, existem "200" candidatos querendo concorrer. Alguns até com o sobrenome "Bolsonaro". E que eu não acho interessante. A Michelle Bolsonaro, por exemplo, tem uma vaga praticamente garantida ao Senado por Brasília, mas daí colocar qualquer um da família Bolsonaro para disputar a presidência teria muitas dificuldades em função da rejeição, mas aí aparecem Ratinho Jr, Caiado, Zema, Tarcísio, que as pesquisas estão testando...muitos nomes. E daqui a pouco o Bolsonaro quer permanecer candidato, para ficar em evidência, por questões políticas, ou porque vai haver seu julgamento, dizendo que ele é o candidato, apesar de estar inelegível. Essa situação, no caso dele, pode trazer alguma defesa, mas para o partido ou aliança de centro-direita, não é bom que não se tenha já um nome.

 

É possível apontar Eduardo Paes como o favorito para vencer as eleições para o governo do Rio e Tarcísio de Freitas, em São Paulo, caso tente a reeleição?

Com relação ao Rio, e em vários outros estados também, mas principalmente no Rio, onde se teve vários governadores e ex-governadores envolvidos em escândalos, ficou um vazio muito grande político, e o Eduardo Paes, até por ter sido eleito e reeleito várias vezes prefeito do Rio, é um candidato muito forte. Não vejo possíveis adversários fortes hoje. Pode ser que apareçam.

No caso de São Paulo, eu acho que o Tarcísio também teria muita chance de ser reeleito. Agora eu acho que talvez o Tarcísio, por governar um estado como São Paulo, que representa quase que 25% do Brasil, se ele estiver bem e for o escolhido da centro-direita pra ser candidato, teria muitas chances de vir a ser eleito presidente. Política a gente tem que estar acompanhando sempre, mas na fotografia de hoje eu acho isso.

 

Pesquisas sobre as maiores torcidas de futebol do país também geram polêmica. Como você entende como o método ideal para chegar mais perto dos números reais?

Talvez esses sejam os tipos de pesquisas mais difíceis em todos os meus anos de Ibope porque nunca sabemos se o entrevistado é, primeiramente, torcedor efetivo, de acompanhar noticiário, de ir a jogos, de gostar mesmo de futebol ou se é de moda. "Ah eu sou Vasco", mas não sabe nem o que é futebol ou " Eu sou Flamengo", mas nunca foi a um estádio. Uma outra situação é saber, dentro dos 27 estados, mais o Distrito Federal, qual é o seu segundo time... qual é o segundo time da pessoa que, geralmente, torce para um time local. Por exemplo: torce para o Bahia e Botafogo, para o Coritiba e Flamengo... é um outro detalhe que teria que se saber para descobrir qual é a prioridade da pessoa em relação ao time de preferência.

Precisamos descobrir também a partir de que idade devemos começar a pesquisar o quesito "Qual o seu time?". A partir de 5 anos, 8, 10, 12, ou a partir dos 16? O mesmo que fazemos com pessoas que têm direito a voto, que podem votar, que são eleitores. O tamanho do universo é importantíssimo porque os garotos de 10, 12 anos, hoje, são consumidores de redes sociais para assistir aos jogos pelo YouTube, por exemplo; de comprar camisa, material esportivo via internet ou na loja oficial do clube etc. Então, essas crianças deveriam ser pesquisadas.

Na verdade, hoje em dia, a maioria das pesquisas começa entrevistando um torcedor com idade maior... então fica muito complicado. Sabemos que o Flamengo é o que tem a maior torcida no Brasil, não sei te precisar o número, que o Corinthians é o segundo, sempre, por causa do tamanho do estado de São Paulo. Depois aparece um pouco de Palmeiras, São Paulo, também por causa do tamanho do estado de São Paulo, Vasco...e a partir daí é uma loucura. Uma porção de times com 2, 3, 4 %. E aparecem casos, por exemplo, em que Minas Gerais tem, vamos supor, uns 15 milhões de eleitores, mas lá existem apenas dois times grandes: Atlético e Cruzeiro. Aqui no Rio você tem, mais ou menos, também 15 milhões e que, hoje, é o terceiro colégio eleitoral (Minas passou a ser o segundo), mas que possui 4 times grandes, Botafogo, Flamengo Vasco e Fluminense... e esses clubes, não que sejam prejudicados, mas, na quantidade, os estados que possuem só dois clubes, com rivalidade muito grande, como é o caso do Rio Grande do Sul, Internacional e Grêmio, como Minas, estão levando vantagem. Não no Brasil inteiro, mas vantagens muito localizadas, seja em Minas ou no Rio Grande do Sul. Enfim... é muito complicado, muito complexo, muito genérico fazer pesquisas sobre o tamanho de torcidas de futebol.

 

No ano início de 2024, após a frustração da perda do título do Campeonato Brasileiro de 2023, em algumas entrevistas, você se manteve confiante na gestão da SAF do Botafogo e, principalmente, na liderança de John Textor. Em seguida, o clube conquistou 2 títulos superimportantes no mesmo ano: o Campeonato Brasileiro e a Copa Libertadores da América. Neste ano, o empresário americano tem se mostrado menos presente no clube e recebido muitas críticas vindas de setores da imprensa e de parte dos torcedores. Sua confiança se mantém ou você faz coro com essas desconfianças que parecem crescer com algumas decisões tomadas pelos executivos do futebol?

A SAF foi a salvação do Botafogo. O clube iria morrer. Aos pouquinhos. Clube de futebol nunca morre, né? Mas vira América...tipo um clube sem chances de disputar, de ganhar. A diferença é que o Botafogo tem uma grande torcida no Brasil. Foi um acerto total da SAF.
Já estávamos trabalhando nisso durante 3 anos antes dela começar. Foi muito bom já termos trabalhado tudo, auditoria, etc. Agilizando o processo. Demos sorte de encontrar uma pessoa como o John Textor, superprofissional e que se apaixonou pelo clube depois de ter comprado. Comprou friamente como empresário, como negócio e foi se apaixonando. Realmente tivemos problemas em 2023, treinadores que aparecem com a vitrine do Botafogo, geralmente portugueses desconhecidos, ficam conhecidos e recebem propostas milionárias.
Um dos acertos da SAF, na minha opinião, foi a participação acionária de 90% para o grupo do Textor e 10% para o Botafogo. Porque assim se tornou um negócio firme que não tem nenhum tipo de ingerência. Outras SAFs, como a do Vasco, por exemplo, que o clube ficou com 30% e tendo alguma ingerência do clube associativo, não deu certo. SAFs, como a do Cruzeiro, do Atlético MG, que os credores acabaram investindo no clube, como é o caso do Pedrinho, do supermercado, e de quando o Ronaldo tentou, mas também não deu certo, no Cruzeiro. No caso do Atlético MG, os principais credores colocaram muito dinheiro, pessoal da MRV e do BMG acabaram misturando torcedor e credor. São SAFs que não são totalmente nos moldes da do Botafogo.
No Botafogo deu tudo certo. Apesar do fracasso de 2023, que foi uma decepção muito grande, acho importante ter acontecido para o ano da "Glória Eterna" que foi o de 2024. E, claro, as contratações do Almada e do Luis Henrique, quando estávamos praticamente eliminados, e a chegada do Arthur Jorge, que fez um grande trabalho, foram fundamentais.

 

E quais são suas expectativas para este ano?

2025 começou "rateando". O departamento de scout, que acertou tudo em 2024, na minha opinião, apostou muito este ano em jogadores mais novos...talvez até pudesse apostar, mas tendo também alguns "carnes de pescoço", mais fortes, para esse primeiro momento. O Botafogo apostou muito em jogadores jovens. É bom, mas é preciso ter uma base boa de elenco para absorver esses garotos. Mas estou esperançoso. Também, óbvio, que não vamos ganhar todos os anos. O importante é disputarmos bem sempre. E o Textor continua sendo o meu ídolo, o que me deu a maior alegria da minha vida com a conquista da Libertadores. E é bom lembrar que mesmo na época de Garrincha, Didi, Amarildo, Quarentinha, Zagallo, Nilton Santos, Manga; na época de Rogério, Gérson, Roberto, Jairzinho e Paulo Cézar, não ganhamos. Então foi um fato inédito na história do clube e eu acho que ele tem muito crédito, às vezes se acerta ou erra. Imagine: quando o Textor entrou o Botafogo tinha 130 milhões de reais ano de faturamento e 1 bilhão e 200 milhões de dívidas. Hoje tem uma projeção de faturamento de 1 bilhão, faturou 700 milhões no ano passado e as dívidas caíram de 1 bilhão e 200 para o patamar de 550 milhões. Além de ter conseguido a "Glória Eterna" dentro de campo, o clube está no caminho certo fora também.

 

No final de 2023, e durante parte de 2024, Textor fez duras acusações sobre manipulação de resultados no Campeonato Brasileiro vencido pelo Palmeiras. Depois, aos poucos, foi abandonando o assunto, o que originou várias críticas a ele e às suas posturas, segundo a imprensa e opositores, de populistas e inconsequentes. O que estamos vendo nesse início de campeonato é, mais uma vez, muitos erros de arbitragens, vários equívocos do VAR e, para completar, escândalos envolvendo jogadores ligados a apostas suspeitas nas BETs. Corrupção no futebol, sabemos, sempre existiu. Como você definiria o momento atual e o que poderia ser feito para que esses graves problemas sejam resolvidos ou diminuídos?

As denúncias que o Textor fez, só que a voz dele foi amplificada, foram em cima de fatos já sabidos, coincidências esquisitas de arbitragem, de VAR, de uma série de coisas, como as com alguns árbitros. Tanto que não houve punição alguma a ele...e muitos acharam que o Botafogo seria prejudicado em função disso e não foi em nada no ano passado. Não foi beneficiado e nem prejudicado.

Tem que profissionalizar a arbitragem, tem que dar cursos, tem que ter salários para eles, renovação, uma série de coisas, e isso os clubes podem fazer ao invés de ficar dando dinheiro para a CBF.

Sobre as BETs, apostas, tudo é algo "maluco" e mundial. O movimento que se faz nessas apostas é um perigo. Algo como se fosse um cupim...e se não resolver, corrigir agora, não vai sobrar nada e o futebol vai ficar em risco. O que está acontecendo é um escândalo, um absurdo. Jogadores que ganham 1 milhão, 800 mil...2 milhões por mês, como os casos que foram falados como os do Paquetá, Bruno Henrique, e tudo isso a pedidos de familiares: " Recebe aí um cartão amarelo, eu aposto 5 mil, ganho 20 mil..." E os envolvidos, às vezes, para se livrar dos chatos das famílias, que pedem isso, entram nessa onda e colocam em risco toda a carreira, o nome fica pichado, é muito ruim. Na minha opinião, nesses casos, tem que se cortar pela raiz o mal. Pegar um ou dois jogadores de nomes, e banir do futebol. Banir. Para que sirvam de exemplo para todos, para os jovens, os mais velhos, os veteranos, para que pensem: "Se eu fizer isso vou acabar com a minha carreira". Porque isso não tem meio termo. Não tem que aceitar, punir só por 1 mês, 2 meses, por 5 jogos...tem que punir para o resto da vida porque essa gente não gosta de futebol. Quando você começa a manipular através dos atores, dos protagonistas do espetáculo, se está acabando com o futebol.

 

Algumas notícias e acusações graves envolvendo o John Textor e os negócios do empresário nos EUA têm surgido ultimamente. E mais recentemente com o Lyon, um dos clubes do seu grupo que poderia ser excluído de competições europeias. Elas te preocupam?

Não tenho detalhes dessas coisas. Esse assunto sobre o Transfer Ban que o Lyon está sofrendo na Fifa por causa de falta de pagamentos, acho normal, eles vão lá e pagam e resolvem. Como alguns clubes no Brasil sofrem. Problemas de caixa. Não conseguiu pagar, se for punido, paciência.

Agora, sobre as outras acusações... quando a pessoa começa a fazer sucesso, quando tem holofotes em cima, é vencedor, está ficando forte, normalmente vai aparecer uma porção de coisas, várias notícias contrárias, xingando, dizendo, "é assim, é assado". Pode ser o que for, o Textor será o meu ídolo para o resto da vida. Um botafoguense novato, mas que já está apaixonado como todos nós, botafoguenses.

 

Qual a sua opinião sobre a gestão do presidente da CBF Ednaldo Rodrigues e a sua reeleição para mais 4 anos à frente da entidade?

Eu não conheço o Ednaldo pessoalmente. Só o cumprimentei uma vez quando o Botafogo foi campeão do Brasileiro, no ano passado, e não irei julgar quem eu não conheço, mas o retrospecto dos últimos 20 anos da CBF é horrível, uma coisa pavorosa. Diria, uma prova da incompetência total e uma corrupção a olhos vistos, com vários presidentes afastados, presos. Acho que enquanto não "arrumar a casa" e se ter uma a mudança de cima para baixo, acaba afetando a Seleção Brasileira.

A Seleção tem vários jogadores de empresários, de negociatas, de "convoca ele aí para botar na vitrine e eu ganhar mais dinheiro". E isso é um absurdo total. Tem que se investir na base, tem que ter pessoas profissionais. Acabar com esse negócio que na Seleção Brasileira só pode ter técnico brasileiro. Hoje em dia temos muita gente preparada no mundo todo. A Liga inglesa mostra vários técnicos competentes. Os portugueses nos clubes estão fazendo um trabalho excelente. Esse técnico do Palmeiras, o Abel Ferreira, é muito bom, o Luís Castro, o Arthur Jorge, fizeram um trabalho muito bom aqui no Botafogo...Enfim, eu acho que tem que se pegar os melhores.

 

E o futuro da Seleção Brasileira para a Copa de 2026?

O Brasil é referência no futebol, então tem que pegar os melhores dirigentes para dirigir a Liga; os melhores profissionais para comandar a comissão de arbitragem; os melhores técnicos para elaborar tabelas, campeonatos, calendários, negociar com televisão. Como é na maioria dos países grandes europeus, as entidades, as "CBFs de lá", só cuidam das seleções, e a Liga cuidando dos clubes, dos campeonatos, torneios.

Aqui deveria ser o mesmo. Uma direção da Liga, séria, cuidando do marketing, cuidando da parte de operações, comercial, negociando com a televisão. Por que a CBF tem que ganhar percentual da televisão, de placas dos jogos dos clubes? Por que ela tem que escalar árbitros? Ela tem um dinheirão em caixa, escala os árbitros, o VAR e não profissionaliza? E aí se vê coisas escandalosas, esquisitíssimas. No Brasil, o VAR não serviu para nada. A polêmica continua, não se respeita. Lá fora, uma decisão do VAR demora 15 segundos, aqui temos decisões que demoram 5 minutos.

A CBF tem que cuidar exclusivamente das seleções, pegar o melhor técnico para a principal, para a feminina, para as de base, ficar atenta às divisões de base, aos garotos, ter observadores em todo o Brasil, lá fora também...para organizar. Organizar e não deixar ter interferências de ninguém de fora. Pular fora de empresários que ficam dando grana para a CBF convocar jogadores conhecidos que vestem a camisa "amarelinha", agora eu não sei se será "amarelinha ou vermelha" (risos) para serem muito valorizados. É preciso organizar. Se isso não for feito até 2026, ou começar a ser feito imediatamente, não vejo o Brasil com chances reais de ser favorito e de ganhar. Acho que Alemanha, Itália, Argentina, Brasil, pelo número de campeonatos mundiais que ganham sempre e sempre vão ser favoritos, mas existem muitas seleções da Europa crescendo...na América do Sul. Você vê o futebol evoluindo em vários países e nós paramos um pouco no tempo e isso, na hora das competições importantes, é que se vê se você está no caminho errado ou no caminho certo.

 

E sobre a formação de duas Ligas?

Acho que quando se tem duas Ligas, acaba agradando a CBF porque elas ficam mais fracas. Quando acabar com essas diferenças, ficará um grupo só...e mais forte. Com os 40 principais clubes brasileiros. 20 da primeira e 20 da segunda divisão.
Acho que essa divisão é uma briga idiota. Cada um querendo ganhar um pouco mais que o outro. Vão ganhar muito mais se tirar toda a organização das mãos da CBF e se ter um comando dos clubes para cuidar de todo o futebol brasileiro, fora a questão das seleções, mas, pelo que eu soube, até o final deste ano, teremos uma única Liga, e acho que a partir de 2027 os clubes irão tomar conta do futebol brasileiro, e tudo voltado para o futebol no Brasil através de uma só Liga; mas para começar, organizar isso, é preciso que todos os clubes estejam unidos para se pensar no ano que vem, porque se tem contrato em vigor, uma série de coisas.

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