CINEMA

Verhoeven fala do seu novo filme em Cannes

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Por MYRNA SILVEIRA BRANDÃO
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Publicado em 11/07/2021 às 13:07

Alterado em 11/07/2021 às 13:07

Atriz Virginie Efira, que interpreta Benedetta Foto: Guy Ferrandis / SBS Productions

“Benedetta”, de Paul Verhoeven, que concorre à Palma de Ouro, teve sua première mundial na 74ª edição do Festival de Cannes, com a presença do diretor holandês e das protagonistas: a belgo-francesa Virginie Efira e a também belga Daphne Patakia.

Com roteiro de David Birke – que volta a trabalhar com Verhoeven após a parceria em “Elle” (2016) –, “Benedetta” é uma história que mescla religião, lesbianismo, erotismo e polêmica, não faltando diálogos que revelam a hipocrisia de líderes religiosos.

A trama, baseada em eventos reais, se passa no final do século 17, enquanto a peste assola a Europa e Benedetta Carlini (Efira) ingressa no convento de Pescia, na região italiana da Toscana, como uma noviça que, desde muito cedo, parece fazer milagres. Seu impacto na vida da comunidade é imediato e chama atenção do Vaticano. Mas o envolvimento amoroso com Bartolomea (Patakia), uma jovem que chega ao convento, muda o rumo da história.

O filme é a adaptação do livro “Atos Impuros: A vida de uma Freira Lésbica na Itália da Renascença”, da historiadora Judith C. Brown, que realizou um estudo sobre o julgamento da Irmã Benedetta Carlini pela Igreja Católica. Ao pesquisar arquivos em Florença para outro projeto, Brown abriu uma caixa e encontrou a ata desse processo, considerado um dos primeiros relatos sobre lesbianismo na Europa moderna.

O bom elenco inclui a britânica Charlotte Rampling, que interpreta a abadessa, superiora do Mosteiro, e o franco-irlandês Lambert Wilson, que vive o núncio, representante diplomático da Santa Sé.

Numa conferência de imprensa promovida pelo festival nesse sábado (10), a equipe de “Benedetta” falou sobre o filme, as motivações para realizá-lo e a preparação para viver as personagens.

“Refletir como evoluímos”

Bem-humorado e, por vezes, até um pouco irônico, Verhoeven iniciou a entrevista contando que a ideia de realizar a adaptação do romance para as telas surgiu quando ganhou o livro e lembrou que anteriormente já haviam lhe dito que a história daria um ótimo filme.
“Comecei a lê-lo e me surpreendi profundamente com esse fato ocorrido no século 17 na Itália, entre duas mulheres que eram freiras. O que sabemos de religião nos diz que uma história assim seria impossível naquele século. Não existia sequer uma definição para o lesbianismo e sua prática era proibida. Analisando as diferenças entre aquela época e hoje, tive vontade de fazer o filme para refletir como evoluímos em relação ao assunto. Junto com David (roteirista David Birke), adaptamos a narrativa, já que o livro é muito acadêmico, bem distante de um romance com uma história definida. Fico muito feliz que tenha sido possível realizá-lo e que todo o processo de produção tenha sido maravilhoso, agradável e terno. Espero que todos consigam perceber isso no filme”, disse o diretor revelando o que mais o preocupou durante a filmagem.

“O que mais me moveu foi o fato de que eu estava lidando com uma história real, com eventos que de fato aconteceram. Eu não fiz o filme baseado em alguma concepção que tinha sobre feminilidade; eu me baseei nas palavras ditas pelas freiras e que estão no livro. Enfim, eu não inventei nada como algumas pessoas podem pensar. As cenas mostram o que realmente ocorreu. Eu acho que nunca fiz nada tão preciso na minha vida e certamente foi isso que contribuiu para ter dado certo”, afirmou Verhoeven.

Quanto às acusações já feitas a seu filme relacionadas com blasfêmia, o diretor disse que não entende como podem acusá-lo de praticar blasfêmia sobre algo que é real, ocorreu de fato.

“Mesmo que isso tenha sido em 1625, não podemos mudar a história. Podemos até discutir se foi errado ou não, mas o fato é que tudo que está retratado no filme aconteceu”, enfatizou Verhoeven, muito elogiado por Efira quando explicou como se preparou para transmitir a ambiguidade de Benedetta.

“Quando o Paul preparava a câmera para filmar, eu tinha que saber como mostrar a ambiguidade dela. O que mais me ajudou foi a confiança que ele teve e passou para os membros da equipe. Em cenas difíceis em que minha personagem era possuída, as instruções que recebi do Paul me deixaram muito mais confortável para fazer a cena”, disse Efira, complementada por Patakia, que aceitou o convite para fazer o filme até antes mesmo de ler o roteiro.

“Aceitei porque o diretor era o Paul e, quando li o roteiro, me surpreendi porque não havia nenhuma cena normal, digamos assim. Quando ela começava normal, rapidamente tinha uma virada e ficava estranha, meio louca. Mas o Paul conversou muito comigo, inclusive sobre as cenas de sexo, então ficamos na mesma sintonia como tudo seria filmado”, ressaltou a atriz.

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