CINEMA

CRÍTICA: Vingança feminista, sem ‘lacração’

Cotação: quatro estrelas

Por TOM LEÃO, nacovadoleao.blogspot.com.br
nacovadoleao.blogspot.com.br

Publicado em 16/03/2021 às 12:57

Alterado em 16/03/2021 às 12:57

Carey Mulligan como a perturbada Cassandra em Bela Vingança Divulgação

No começo desta semana, foram anunciados os nomes dos filmes - e profissionais neles envolvidos - que vão concorrer ao Oscar 2021. E nas categorias filme, atriz e direção, entre outras, consta, merecidamente, “Bela Vingança” (“Promising Young Woman”), desde já um dos melhores e mais perturbadores filmes do ano.

Tanto o trabalho de atuação e entrega de Carey Mulligan (como a perturbada Cassandra), como a direção firme de Emerald Fennell (atriz de séries como ‘The Crown’ e ‘Killing Eve’, estreando na direção de longa, com muita competência), bem como toda a parte técnica do filme (além do bom roteiro, fotografia e som impecáveis) são irretocáveis. O resultado final é um dos mais formidáveis filmes de vingança já vistos.
Acompanhamos a tímida e frágil Cassandra que, apesar de já estar na casa dos 30 anos, ainda mora com os pais e não tem namorado (não que isso seja obrigatório, parece nos dizer a personagem). E, mesmo tendo sido uma universitária com altas notas na cadeira que escolheu (Medicina), preferiu trabalhar como atendente de cafeteria. Por quê?

É o que o filme vai nos revelando, em camadas: houve um evento trágico e marcante em seu passado (quando estava na universidade), do qual ela só vai se livrar do trauma após concluir um bem urdido plano de vingança. Que vai aplicando lentamente.

E o modo como este plano é desenrolado (que lembra até os intrincados e violentos filmes de vingança do diretor coreano Chan-Wook Park, de “Oldboy”) nos deixa presos à trama e sem piscar os olhos. Nada nunca é o que parece. Todos os clichês são demolidos. Mas sem nunca subestimar a inteligência do espectador.
A diretora (e também autora do roteiro) tece um excelente filme feminista, sem entrar no discurso fácil da ‘lacração’ que rege o cinema e os dias atuais. Sim, várias questões que - no dia a dia - sempre põem a mulher em posição inferior ou de perigo são mostradas e demolidas. Sem panfletarismo barato.

A entrega de Mulligan no papel de Cassie é tamanha, que nos deixa sem fôlego. A moça com um futuro promissor, como diz o título original (baseado no de uma matéria sobre estudante envolvido em caso de estupro, nos Estados Unidos, quando a maioria da imprensa se referia a ele como um ‘jovem promissor’, de modo complacente, porque homem branco e rico), abre mão de tudo para alcançar o seu objetivo.

E só nos resta aplaudir, ao final, as duas mulheres (Mulligan e Fennell) que fizeram o filme acontecer, apesar dos percalços (foi financiado até por meio de vaquinhas, em sites de crowdfunding). Bravo!