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Sônia Guajajara vem ao Rio, quinta, para a exposição 'Hamxop tut xop', no Catete
Por CADERNO B
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Publicado em 01/07/2025 às 18:46
Alterado em 01/07/2025 às 19:15

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Realizada pelo Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, através da Associação de Amigos do Museu do Folclore Edison Carneiro, começa nesta quinta-feira (3), às 17h, na Sala do Artista Popular, a exposição Hamxop tut xop - as mães das nossas coisas: artesanato em fibra de embaúba, breve panorama sobre a etnia Maxakalia única a falar a própria língua no estado de Minas Gerais. O evento de abertura contará com a presença da Ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, dos artistas e guardiões da etnia, Sueli e Isael Maxakali, e abrigará a pré-estreia do documentário “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá”. A entrada é gratuita.
O público poderá conhecer como os Maxakali mantêm vivo o ritual com a embaúba, árvore natural da Mata Atlântica, hoje quase extinta nos territórios em que eles habitam no Nordeste mineiro. A mostra enfatiza o protagonismo da embaúba na cultura e nas tradições. A fibra retirada é a base para a tecelagem de bolsas, colares e braceletes, únicos e repletos de significados. A embaúba é considerada instrumento de cura. O documentário “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá” fala sobre a busca de Sueli Maxakali pelo pai, indígena da etnia Kaiowá, retirado da convivência na aldeia durante a ditadura militar. Será exibido às 18h30.
Responsável pela pesquisa e texto da exposição, o antropólogo Roberto Romero é codiretor do filme. Há 15 anos convive com os Tikm’n, autodenominação do povo também conhecido como Maxakali. O povo é tema tanto de seu mestrado, como de seu doutorado. “Esta é a primeira vez que ocorre uma exposição da arte das mulheres Tikm’n, na SAP. É uma oportunidade importante para dar a conhecer a admirável tecelagem da fibra natural da embaúba, um patrimônio cultural deste povo”, diz.
Doutor em Antropologia pelo Museu Nacional (UFRJ), desde 2023 Romero integra a equipe de coordenadores do projeto Hãmhi | Terra Viva, que forma agentes agroflorestais e viveiristas indígenas Tikm’n. É a partir daí que também passa a atuar nos quatro territórios demarcados no Vale do Mucuri. Atualmente, é também coordenador de articulação comunitária e comunicação do projeto Hãmhi | Terra Viva.
Uma série de iniciativas impulsionam o resgate da presença Maxakali no Brasil. De acordo com o Censo de 2022, no país existem mais de 300 etnias indígenas. Desse total, 19 etnias habitam o estado de Minas Gerais. A população Maxakali é estimada em 2.629 habitantes. Em 1940, chegou a 50 indígenas. O povo Tikm’n está distribuído entre as aldeias Água Boa, Pradinho, Aldeia Verde, Cachoeirinha e Aldeia-Escola-Floresta, nos municípios de Santa Helena de Minas, Bertópolis, Ladainha e Teófilo Otoni - uma das regiões que mais aqueceu no Brasil nos últimos anos, segundo dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden).
No texto do catálogo, acessível no site do CNFCP (www.cnfcp.gov.br), Romero oferece um breve inventário dos Maxakali:
“Árvore muito comum na Mata Atlântica, de cuja casca as mulheres Tikmu’un extraem fibras usadas para fiar as linhas com as quais tecem bolsas, redes, colares, pulseiras, cordoes, tipoias e máscaras para os espíritos yãmiyxop, desde tempos imemoriais. Entre as/os Tikmu’un, a busca pela embaúba é uma tarefa compartilhada por um ou mais casais, mas também por mulheres viúvas ou solteiras, geralmente acompanhadas por seus genros ou primos. Aos homens, cabe abrir caminhos na mata e cortar as árvores, muitas vezes de difícil alcance. Às mulheres, cabe descascá-las com a faca e as mãos, enrolá-las delicadamente e transportá-las até suas casas, onde raspam as cascas, extraindo a fibra que usam para fiar manualmente as linhas em suas coxas”, contextualiza.
Para Rafael Barros, diretor do CNFCP/IPHAN, a exposição do artesanato Maxakali soma às iniciativas para o fortalecimento da etnia. “Trata-se da última etnia a falar a própria língua no estado de Minas Gerais! Há um conjunto de ações multidisciplinares para fortalecer os Maxakali, como o programa Terra Viva, que visa garantir as condições do povo com seu bioma tradicional, por exemplo”, destaca.
A etnomusicóloga Rosângela de Tugny coordena a iniciativa que vem mudando a paisagem nos territórios Tikm’n, “O projeto Hãmhi | Terra Viva contribui para o enfrentamento das mudanças climáticas e tem como perspectiva o reconhecimento da força linguística e cultural do povo Tikm’n, apresentando um modelo de formação profissionalizante em nível médio que, a um só tempo, valoriza sua riqueza linguística e fortalece a autonomia alimentar”, afirma a coordenadora-geral do projeto.
Rosângela pesquisa o universo Maxakali há 20 anos. “O povo possui 12 sistemas musicais, em termos de comparação, como se fossem 12 latins”, compara. De mitologia fina e complexa, a resistência secular de um repertório simbólico como o Maxakali está contida nos cantos. “Passei oito anos registrando os cantos. Levei um estúdio da Universidade Federal de Minas Gerais para gravar direto com os pajés, transcrevendo e traduzindo o repertório. Eles não têm perdas linguísticas. Impressiona a capacidade da transmissão de conhecimento entre eles”, destaca. Autora de livros e à frente de iniciativas pró-Maxakali, Rosângela atualmente integra a Universidade Federal do Sul da Bahia, em Porto Seguro.
Foto: Oscar Liberal/divulgação
Foto: Oscar Liberal/divulgação
Foto: Oscar Liberal/divulgação
Feitos a partir da fibra de embaúba, os colares são a tradução do grafismo único dos Maxakali
Filme
A pré-estreia do filme “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá” ocorrerá no jardim do Palácio do Catete, às 18h30. Às 20h, será o debate com a presença da ministra Sônia Guajajara, os diretores Sueli Maxakali, Isael Maxakali e Roberto Romero, e do professor Eduardo Viveiros de Castro. No dia 10 de julho, entra em circuito em salas de cinema de todo o país. O documentário registra a busca de Sueli e Maiza Maxakali pelo pai, Luis Kaiowá, que foi separado delas durante a ditadura militar no Brasil. Roberto Romero codirige o filme que parte da separação de Luís Kaiowá da mulher e das filhas no contexto da ditadura militar. A busca de Sueli e Maiza para reencontrar o pai começa a se configurar a partir das redes sociais, atravessa a pandemia de Covid-19 e oferece uma visão sobre momentos que transpassam as realidades do país em vários tempos. Como as lutas enfrentadas pelos povos indígenas no Brasil contemporâneo. No site www.meupaikaiowá.com.br há mais informações sobre o filme.
Serviço: Exposição Hamxop tut xop - as maes das nossas coisas: artesanato em fibra de embaúba. / Abertura às 17h, na Sala do Artista Popular / Pré-estreia do documentário “Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá”, às 18h30 / Às 20h, começa o debate reunindo a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, os diretores Roberto Romero, antropólogo também autor da pesquisa e texto da exposição, Sueli Maxakali, Isael Maxakali e do professor Eduardo Viveiros de Castro. Entrada franca.
Museu de Folclore Edison Carneiro – Rua do Catete, 179. Catete – RJ. Tel. 21 3032.6052 | Inauguração: 03 de julho, às 17h. Encerramento: 28 de setembro. Dias e horários de visitação: Terça a sexta-feira, das 10h às 18h. Sábados, domingos e feriados, das 11h às 17h.
Realização: Associação Cultural de Amigos do Museu do Folclore Edison Carneiro (Acamufec) | Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular do Instituto de Patrimônio e Histórico e Artístico Nacional (CNFCP/Iphan).
Apoio: Museu da República.