ARTIGOS
O Brasil na bacia das almas: uma quase fábula
Por ADHEMAR BAHADIAN
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Publicado em 17/08/2025 às 09:34
Alterado em 17/08/2025 às 09:41

Trump é um conhecido jogador embusteiro. Sua vida como empresário oscila entre a ostentação argentária e os sucessivos encontros com a justiça. Nada nele é transparente. Tudo é sinuoso. Toda palavra tem duplo, triplo ou quadrúpede sentido.
Na política, o embuste se aprofundou e adquiriu tonalidades de uma sem-vergonhice e um desprezo pela inteligência humana sem par. Todo estúpido tem a insanidade de se julgar sábio.
A mistura de narcisismo, prepotência e poder é uma forma de cicuta mental. Trump acredita em sua genialidade. No fundo, acha que Deus pode até existir, mas certamente não tem sua presença de espírito. Trump é deus com espírito de porco.
Nele a verdade é uma metáfora. Nem sei se Trump sabe a diferença entre a mentira, o embuste, a tapeação, a lorota e a vigarice mais vulgar. Para ele, assim como para as crianças e os loucos, as palavras são mágicas e não designam verdades, mas floreios da imaginação.
Na criança, um sinal de enriquecimento mental. No adulto, a marca do delírio.
MAGA, mesmo em inglês, tem contato com magia, com MAGO, e em seus comícios não há como não ver a logorréia de Trump como um cantochão em que as palavras se perdem e não se afirmam. Trump tem um vocabulário escolar, de adjetivação pobre, precária. Suas frases se repetem diariamente, não há empatia quando elogia, há cinismo e hostilidade quando critica.
Comparem com Obama: cada frase, uma tese. Cada pausa, uma reflexão. Releiam o discurso de Obama na Universidade do Cairo. Trump jamais o pronunciaria. Escapa a seus neurônios. Trump odeia Obama. Baba de raiva diante de tanta arte de dizer. Trump é um anão intelectual. Tem, para azar nosso, uma sintonia fina com as camadas mais primitivas da mente humana. Conhece-as bem, e as explora com maestria. É um geógrafo dos submundos humanos.
Não há de ser apenas por achar que as Universidades americanas são antissemitas que Trump as quer destruir, assim como quer domar instituições centenárias que honram a inteligência americana. A cultura, como já disse uma alma irmã dele, Trump, provoca-lhe impulsos assassinos.
Exagero? Por que, então, querer apagar da história dos Estados Unidos o trabalho civilizatório de instituições centenárias e, desta forma, privilegiar uma cultura revisitada, falsamente asséptica, desprovida de contradições ou tensões raciais históricas em que o americano seria o padrão genético inatacável? Já não vimos isto no século 20? Estamos diante de uma recauchutagem étnica? E a demonização do imigrante?
O MAGA, quem diria, guarda estreita coerência com os propósitos de uma agenda de arrepiante horizonte retrógrado. E não apenas no plano político. Mas nos aspectos mais fundamentais do desenvolvimento dos Direitos Humanos.
Torna-se a cada dia mais evidente que o papel da mulher na sociedade americana sofre constrangimentos impensáveis.
Desde a campanha contra o aborto até o ressurgimento de seitas religiosas que pretendem retirar das mulheres o direito ao voto, função que seria exercida apenas pelo pater-família, homem clarividente e produtor.
Hoje me parece cada vez mais profético e menos ficcional o livro da canadense Margareth Atwood “O Conto da Aia”, também disponível nas plataformas da televisão brasileira. Veja, antes que o proíbam mundialmente.
Mas nada me intrigou tanto quanto a hostilidade de Trump ao Brasil. A insinuação de que o Brasil é um país que não respeita os Direitos Humanos, tão abusadamente retratado no relatório elaborado pelo Departamento de Estado, tem, antes de mais nada, o efeito deplorável de tornar um instrumento até então respeitado internacionalmente numa catilinária odiosa, politicamente desastrosa, e nos faz lembrar dos momentos terríveis dos anos 60 do século XX, quando tivemos, sim, problemas terríveis de abuso, tortura e morte, como a cinematografia corajosa de Walter Salles nos mostrou no “Ainda estou aqui”, sem que os Estados Unidos, na mesma época, fizessem relatórios com a mesma “perspicácia" que hoje parecem ter.
Uma leitura mais detida de Trump, sobretudo à luz de seu constante zigue-zague entre verdade e ficção, me fez desconfiar de que Trump quer comprar o Brasil na bacia das almas.
Para tanto se vale de astúcia e procura confundir os brasileiros como se ele, Trump, em seu momento alfa do espírito de porco, nos viesse salvar de um mergulho no autoritarismo de esquerda ao nos acenar com a bandeira pirata do autoritarismo neocolonial da extrema direita americana, capitaneada por Steve Bannon.
Não é segredo para ninguém que Steve Bannon, depois de Olavo de Carvalho, é o guru do nosso, como diria Stanislaw Ponte Preta, se vivo fosse, FEBEAPÁ (Festival de Besteiras que assola o país) do novo milênio.
E a intriga é insidiosa. Invertem-se os sinais. Quem traiu, traidor não é. Como diria Calabar, de triste memória. Quem resistiu em nome da legalidade bom sujeito não é. Tudo em ritmo de “foi em Diamantina onde nasceu JK”… lembram? Perguntem a seus pais.
Mas, por que o Brasil, meu Deus? Bem, a razão é simples. E quem me contou foi o Corvo, não o de Allan Poe, mas o outro, o da “eterna vigilância” que entende dessas coisas.
Ocorre que, outro dia, o rei-sol enquanto passava glostora em suas melenas, melancólicas melenas melequentas, ousou perguntar ao espelho mágico se havia um rei mais solar do que ele. E dele, mágico espelho, recebeu o tuíte quentinho. Existe, sim. E se chama Lula-lá.
Furioso, o rei-sol chamou Bannon. ”Eles descobriram". Gritou. "Esses bagres descobriram. A gente só queria trocar cem por um milhão. As terras raras. O petróleo equatorial. Um naco da Amazônia. A garota de Ipanema. E ficamos de bumbum de fora. Logo para eles que vocês me diziam ser a República dos Bananas".
Mangueira, Mangueira querida, onde estão teus tamborins? Olelê, Oxalá, Oludum. A ala dos sem-nação vai passar.
VAI PASSAR.
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EM TEMPO:
A reunião no Alasca serviu para confirmar que a geopolítica de Trump se mede pela régua e compasso do raciocínio do agente de imóveis. O Departamento de Estado estava lá como figurante. O estrategista de Trump era um velho amigo das artimanhas do czar do setor imobiliário de Nova York.
2. Por falar em czar, Putin deu uma faturada. Pegou até uma caroninha no papamóvel. E ainda propôs uma vodka-tônica em Moscou.
3. Enquanto isso, aqui no Patropi, a descortesia e a cafonice imperam: retirar o visto de uma criança de dez anos só porque ela é filha do ministro da Saúde cheira a violência gratuita. Retirar os vistos de dois técnicos do "Mais Médicos” não cheira, fede.
4. Informação aos navegantes: não há necessidade de visto americano para visitar os lençóis maranhenses. Nem para dar um pulinho na orla do Rio e ver o melhor pôr do sol bem acompanhado e bebericando uma caipirinha de morango, fruta da moda. Morango do amor.
5. Tudo numa boa.
Adhemar Bahadian. Embaixador aposentado