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Como a Inteligência Artificial pode transformar as remunerações

Por CRISTIANA AGUIAR
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Publicado em 28/05/2025 às 13:53

Alterado em 28/05/2025 às 13:53

Quando se falava em futuro do trabalho, há cerca de cinco anos, já era comum o discurso de que as competências comportamentais, intituladas de soft skills, se sobressairiam frente às competências técnicas ou hard skills, em função da Inteligência Artificial.

Em novembro de 2023, o ChatGPT chegou ao Brasil, trazendo uma mudança gradual no mercado de trabalho. A IA começou a ocupar um espaço novo e aparece como uma catalisadora de resultados em diversos departamentos nas empresas.

Minha provocação neste artigo é sobre a repercussão dessa questão nos modelos de cargos e salários tradicionalmente utilizados antes desse avanço.

A IA, obviamente, vem substituindo tarefas mecânicas e muito processuais, com a promessa de modificar departamentos inteiros. É a IA tornando-se agente vertical — IA com foco.

O interessante é que, ao levarmos essa realidade para os padrões de gestão de cargos e salários, encontramos uma tremenda incongruência. Os formatos atuais foram desenhados considerando essencialmente habilidades técnicas, diplomas, títulos e experiências.

Com a crescente substituição dessas competências pela IA, como construir modelos mais justos?

Ouso dizer que a avaliação rígida do passado, que foca em títulos e hierarquias, precisa dar lugar a uma análise mais profunda de competências como: comunicação, pensamento crítico e sistêmico, capacidade de resolução de problemas, agilidade e flexibilidade.

É preciso mudar a forma de compensação salarial e de crescimento dentro das organizações. É importante reverter a lógica atual de pagamento das pessoas.

Uma ideia é entender qual o papel da IA sobre o cargo que uma pessoa ocupa e qual o diferencial que esse indivíduo exerce.

A competência de questionar a atuação da IA tende a ser uma das mais valorizadas. Pessoas que têm a capacidade de discernir o quanto as respostas entregues pela IA fazem sentido para o negócio, área, clientes etc. são essenciais para as organizações. Essa competência é chamada hoje de “sensemaker”.

Na década em que nasci, em uma sala de aula, quem oferecia respostas aos questionamentos dos professores era considerado o mais inteligente, enquanto os que faziam muitas perguntas eram taxados como “lentos na aprendizagem”.

O mundo mudou, e é preciso deixar essa ideia de lado. Algumas pessoas continuam com dificuldades em fazer perguntas. Contudo, em um contexto onde as respostas estão disponíveis, a inteligência vem das perguntas.

Voltando à gestão de cargos e salários, a mudança que deve acontecer é basear a remuneração na atuação do dia a dia do colaborador, e não no cargo que ele ocupa.

Imagine uma remuneração de acordo com o impacto que esse colaborador produz na empresa ou na sua aderência à cultura organizacional.

No rufar dos tambores, as empresas hoje em dia já são avaliadas muito mais por fatores intangíveis, como marca, capital intelectual e cultura, do que, por exemplo: tecnologia, máquinas, Capex.

Outro ponto interessante é vislumbrar a possibilidade de uma distribuição da riqueza mais igualitária.

Hoje, no Brasil, a distância entre o salário de um colaborador no nível base e o de um CEO é de 200 vezes. O advento da IA pode trazer uma remuneração mais justa e equilibrada — um modelo de enriquecimento com compensação baseada em comportamento.

Um exemplo impactante é a valorização de serviços que demandam competências humanas. Não duvido que o futuro nos reserve salários mais altos para enfermeiros, cuidadores, entre outros — o que seria muito justo.

Trata-se do mundo dando voltas. O que foi menosprezado com a Revolução Industrial vem chegando com força na era tecnológica: o cuidado com o ser humano.

Com toda essa reviravolta, nos resta um outro cuidado — a atenção para que preconceitos, vieses e pensamentos arraigados não nos impeçam de vislumbrar um futuro próximo.

CEOs que antes se preocupavam com o tamanho de suas empresas vêm sendo engolidos por pequenas startups. Pessoas que não tiverem a humildade de viver o novo e perceber que, cada vez mais, o mundo corporativo clama por remunerações justas, colaboração e propósito, poderão se assustar ao perceber que o futuro do trabalho chegou.

Cristiana Aguiar. CEO da Jeito Certo Consultoria. Economista. Especialista em Gestão de Negócios e Pessoas.

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