TURISMO

Por que a Itália tem tantos Patrimônios da Unesco?

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Por TURISMO JB, [email protected]
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Publicado em 01/08/2021 às 13:38

Alterado em 01/08/2021 às 13:38

Centro histórico de Pienza é Patrimônio Unesco desde 1996 Foto: Ansa

Com uma história milenar e diversos pontos turísticos facilmente reconhecíveis, a Itália é o país com mais locais tombados como Patrimônios da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

São 58 cidades, parques, construções e monumentos de norte a sul da Itália que já receberam o cobiçado título, sendo três deles apenas neste mês de julho.

Até o último sábado (24), o país estava empatado com a China, com 55 cada, mas voltou a liderar o ranking com o reconhecimento dos "Ciclos de afrescos do século 14", em Pádua; da estância termal de Montecatini Terme, na Toscana; e dos Pórticos de Bolonha.

Para a diretora de Marketing e Promoção da Agência Nacional Italiana do Turismo (Enit), Maria Elena Rossi, a quantidade de locais reconhecidos pela Unesco "amplifica a singularidade" do país, com tanta história e cultura entrelaçadas.

"O fato de 60% [dos locais] serem acessíveis por trens regionais faz ainda com que o turismo slow seja apreciado e valorizado. Os sítios estão distribuídos por todo o território nacional, e é inegável o potencial de crescimento para cada região. É uma oportunidade para o desenvolvimento do turismo e para a ressonância do 'made in Italy' no mundo", diz Rossi em entrevista à ANSA.

A diretora da Enit, no entanto, descarta uma competição com a China e afirma que os cidadãos do país asiático estão entre os principais turistas estrangeiros na Itália. Segundo ela, já estão previstas "parcerias entre os sítios Unesco italianos e chineses, na perspectiva de potencializar as relações bilaterais culturais".

O delegado da Accademia della Cucina Italiana, Gerardo Landulfo, também acredita que analisar os dois países apenas pela quantidade de locais tombados não funciona, até mesmo porque eles têm territórios de tamanhos e características muito diferentes - a China, por exemplo, possui uma quantidade maior de patrimônios naturais reconhecidos pela Unesco.

"Qual o peso dos monumentos com valor histórico? Dentro desse número, por exemplo, tem a cidade de Roma inteira, todo o centro histórico. Como fazer essa comparação?", questiona Landulfo.

Ele lembra que a Itália tem cerca de 300 mil quilômetros quadrados de área, enquanto a China se aproxima de 10 milhões.

"Provavelmente, a China vai passar a Itália por conta desse tamanho todo. Não dá para comparar. Para mim, a Itália é um país que tem, independentemente da Unesco, o maior patrimônio artístico e cultural", diz.

Por que tantos patrimônios?

Em entrevista à ANSA, o chefe da Unidade de Nomeações do Centro do Patrimônio Mundial da Unesco, Alessandro Balsamo, explica que diversos fatores fazem a Itália ter tantos locais reconhecidos, incluindo uma certa experiência em montar candidaturas viáveis.

"Há muitos fatores diferentes: a capacidade de produzir nomeações de qualidade e de ter expertise para isso; uma tradição longa de proteção, conservação e gerenciamento de uma herança; mas também o apoio político e financeiro e o envolvimento ativo de expoentes locais", ressalta Balsamo.

No caso da Itália, por exemplo, o primeiro sítio reconhecido foi a "Arte Rupestre do Vale Camonica", em 1979. Desde então, o maior período sem tombamentos foi entre 1982 e 1987. Fora isso, há reconhecimentos quase anuais para o país, com o recorde de 10 de uma só vez em 1997.

"Além de Itália e China, esses elementos são comuns em países como Espanha, Alemanha, França, Índia, México e alguns outros. Não é coincidência que os 15 países com a maior quantidade de propriedades na lista representem 46% de todas as inscrições", destaca Balsamo.

Como um local é reconhecido pela Unesco?

O reconhecimento da Unesco a uma determinada localidade é complexo e lento, e a candidatura precisa passar por uma série de etapas, o que pode demorar anos.

De acordo com o chefe da Unidade de Nomeações do Centro do Patrimônio Mundial da Unesco, apenas países signatários da convenção da entidade e comprometidos com a proteção de sua "herança natural e cultural" podem abrir candidaturas.

"O primeiro passo é fazer um 'inventário' sobre a importância natural e cultural dos locais dentro de suas fronteiras. Esse 'inventário' é chamado de Lista de Tentativa, fornece uma previsão das localidades que um Estado-membro pode apresentar para inscrição nos próximos cinco a 10 anos e pode ser atualizado a qualquer momento", explica Balsamo.

Após essa etapa, os governos decidem quando vão formalizar a candidatura. O representante afirma que a Unesco fornece consultoria em cada passo do processo, desde a preparação até o texto final, um trabalho que exige "especialistas em diferentes disciplinas".

Após sua conclusão, o documento é submetido ao Centro do Patrimônio Mundial. Segundo Balsamo, não há um "prazo padrão" a partir do início do processo. No entanto, assim que o dossiê é submetido formalmente, o Centro do Patrimônio Mundial tem até 16 meses para enviá-lo à sessão anual do comitê responsável pelos tombamentos.

Cada candidatura é avaliada de maneira independente por dois órgãos: o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos) e a União Internacional de Conservação da Natureza (IUCN), que encaminham suas avaliações para o Comitê do Patrimônio Mundial.

"Para ser incluídos na lista do Patrimônio Mundial, os bens indicados devem ter 'Valor Universal Excepcional' e atender a pelo menos um entre 10 critérios de seleção, seis dos quais são para bens culturais e quatro para bens naturais", acrescenta Balsamo, ressaltando que o local precisa ter "um significado internacional", e não apenas se encaixar em valores nacionais ou da região onde está.

A classificação da Unesco prevê que um local pode ser considerado como Patrimônio Cultural, Natural ou Misto. No último caso, o reconhecimento ocorre quando o sítio "satisfaz uma parte ou todas as definições da classificação cultural e da natural".

"Em outras palavras, uma propriedade mista ocorre quando valores culturais e naturais excepcionais não estão apenas presentes dentro das mesmas fronteiras territoriais, mas também estão intrinsecamente ligados. Essa ligação estreita pode ser difícil de demonstrar, e isso explica por que apenas 3,4% dos bens inscritos na lista do Patrimônio Mundial são mistos", destaca o representante da Unesco.

Lista de Patrimônios em Risco

Um assunto que ficou bastante em voga nos últimos dias é a inclusão de locais em uma lista de "patrimônios em risco" ou até mesmo a revogação do tombamento pela Unesco - caso do Porto de Liverpool.

"Veneza e sua Lagoa", inscritas como Patrimônio Unesco em 1987, conseguiram evitar a inclusão na lista vermelha no último dia 22 de julho, mas somente depois de o governo italiano proibir a passagem de navios de grande porte, como os de cruzeiro, pela Bacia de San Marco e pelo Canal de Giudecca, no centro histórico da cidade.

Mas o que significa entrar nessa classificação? De acordo com Balsamo, há várias explicações para um local ser qualificado como "patrimônio em risco", mas não se trata de uma "punição".

"Na verdade, alguns países solicitam a inscrição de um sítio para atrair atenção internacional para seus problemas e obter assistência especializada para resolvê-los. Outros, entretanto, desejam evitar uma inscrição, que consideram uma desonra", ressalta.

Balsamo explica que a lista de locais em risco é um "sistema estabelecido para responder a casos específicos de manutenção" e que precisam ser solucionados rapidamente.

"Em todo o planeta, a conservação de um sítio é uma tarefa extremamente desafiadora. Obras feitas pelo homem ou problemas naturais podem afetar severamente atributos físicos no 'Valor Universal Excepcional'. Terremotos, enchentes, incêndios, mudanças climáticas, turismo descontrolado, conflitos armados, guerras e urbanização descontrolada são apenas alguns dos fatores mais comuns que afetam o patrimônio cultural e natural", diz.(com agência Ansa)