MENTE SÃ

A busca da felicidade

Por BERENICE KUENERZ

Publicado em 18/09/2025 às 16:03

Alterado em 18/09/2025 às 16:03

, Pixabay

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Dizem os filósofos que por trás de todas as nossas buscas na vida está a busca da felicidade. Aristóteles talvez tenha sido o primeiro a dizer que todos os seres humanos agem buscando algum bem, e que o bem supremo é a eudaimonia – termo que costuma ser traduzido como felicidade ou florescimento humano.

Para Aristóteles, viver bem e de forma plena é alcançar essa finalidade, que seria o sentido último da vida. Existe, porém, um entendimento equivocado de que, para alcançar a felicidade, temos que erradicar as dores da vida e as chamadas emoções negativas.

Vemos essas emoções negativas como os vilões que tiram a nossa felicidade. Essa visão tem se fortalecido atualmente com as redes sociais, onde é mostrada apenas uma parte da vida, mas não a realidade, criando uma idealização que nunca levará à felicidade, porque não representa o ser humano em sua totalidade.

Precisamos entender que todas as emoções são válidas e necessárias e que cada uma delas tem uma função importante. Quando você quer eliminar ou ignorar uma emoção, desestabiliza um sistema. É como se tirasse uma peça de uma engrenagem. Sim, nós somos um sistema altamente complexo e, ao mesmo tempo, tremendamente eficiente.

Para construir as condições para a felicidade, precisamos aprender a lidar com todas as emoções. Isso naturalmente inclui as emoções que costumamos chamar de negativas. Seria mais apropriado chamá-las de emoções dolorosas.

Não costumamos focar todas as emoções de modo igual. Discriminamos as emoções dolorosas. Rejeitamos emoções como ansiedade, tristeza, raiva, medo, inveja e insegurança. Tentamos excluí-las, em vez de entender sua função e aprender a lidar com a informação que cada uma delas traz.

Será isso possível no processo humano? Ou seria isso um entendimento equivocado do que é ser humano, e do que seja a realidade da vida?

ABRAÇANDO TODAS AS EMOÇÕES

Tal Ben Shahrar se tornou conhecido por sua aula de Felicidade no curso de Psicologia Positiva em Harvard. Certo dia, ao se sentar com sua bandeja no refeitório, um aluno se aproximou dizendo que um colega de quarto estava assistindo às suas aulas e se encantando com tudo o que estava escutando sobre a ciência da felicidade. Sim, não sei se você sabe, mas felicidade hoje é uma ciência que é tema de muitas pesquisas em grandes universidades americanas.

Voltando à nossa história, Tal convidou o aluno a sentar e compartilhar com ele aquele momento de almoço. O estudante então lhe disse que, como Tal havia se tornado um mestre na ciência da felicidade, nunca poderia ser visto em algum estado que não fosse o de bem-estar e felicidade.

No dia seguinte, em sala de aula, Tal compartilhou com a turma o que ocorrera no refeitório no dia anterior. E disse aos alunos: “A única coisa que não quero que vocês pensem é que eu estou sempre contente, ou que vocês no final do ano estarão constantemente contentes.”

Disse ainda: “Somente dois tipos de pessoas não vivenciam emoções como decepção, tristeza, ansiedade, inveja, raiva, medo: os psicopatas e os mortos. E completou: “Se você não é nenhum dos dois, você as terá!”

Se somos humanos, nós as teremos.

Para vivenciar felicidade, devemos abraçar todas as emoções. Elas fazem parte da totalidade do que somos. Se você reprime alguma delas, todo o sistema é afetado: você instala um certo “programa de repressão”, e outras coisas na sua capacidade de percepção poderão ficar contraídas.

O critério de avaliação são a frequência e a intensidade com que as emoções surgem. Se estamos constantemente tristes, frequentemente irritados ou temerosos, precisamos examinar o que está acontecendo conosco – e pedir ajuda se necessário.

Se as emoções vão e vêm em fluxo, coerentes com as situações e os ventos, está tudo bem com você. Ter emoções dolorosas coerentes com fatos faz parte da navegação pela vida.

A felicidade não acontece quando temos apenas as chamadas emoções positivas, mas quando temos a habilidade de navegar por nossos diferentes estados internos e situações da vida.

CONTROLANDO O IMPACTO MENTAL

Como navegar de forma otimizada por nossas diferentes emoções?

Primeira regra: A emoção que você mais mantiver presente através de seus pensamentos repetitivos é a que mais você experimentará. Ela influenciará seu comportamento, suas escolhas, decisões, definirá sua energia, fisiologia e respiração.

Tenho um amigo que constantemente atribui seu comportamento, ou a ausência de comportamento, a seu medo de cometer alguma falha. Cada vez que pensa e se expressa dessa forma, ele faz uma manutenção da emoção medo e reforça sua sensação e crença de que está limitado por essa emoção. Sem perceber, por meio da repetição desse pensamento ele cria em seu cérebro caminhos neurais cada vez mais fortes, que o limitam. Não são as situações que o limitam, mas o seu próprio pensar.

O medo é uma emoção importante, que pede para nos protegermos. Estará presente sempre que fizermos movimentos de ousar, indo além de nossas zonas de conforto. O medo nos ajuda a estabelecer proteções adequadas e ter cautela, mas não deve impedir nossa ação. Deve estar em equilíbrio com a emoção da coragem.

Coragem não é ausência de medo, mas agir apesar do medo.

Segunda regra: A vida que desejamos começa em nossa mente. As situações deflagram emoções em nossa emocionalidade, porém a maneira como manejamos pensamentos e emoções define o modo como respondemos a cada situação.

Não temos controle sobre o surgimento da maioria das situações, mas temos controle sobre o impacto mental e emocional delas em nós e sobre como escolhemos responder a cada uma delas.

Os filósofos estoicos do século III a.C. ensinaram que a primeira coisa que devemos aprender para ter uma vida de bem-estar e felicidade é diferenciar aquilo sobre o qual temos controle daquilo que não podemos controlar, e colocar nossa energia naquilo em que podemos interferir.

Podemos desenvolver controle sobre nossas mentes.

PRATICANDO FELICIDADE

A tendência geral do ser humano é detectar, registrar e responder mais rapidamente a possíveis ameaças do que a eventos agradáveis. Isso é chamado de viés de negatividade, e tem uma base evolutiva, neurológica e psicológica. Portanto, temos que trabalhar consciente e intencionalmente a positividade de nossa mente, para desviá-la da negatividade e alcançarmos bem-estar e felicidade.

Uma ferramenta que você pode utilizar para positivar sua mente é a Prática do “Como Se”. Consiste em adotar comportamentos, pensamentos e posturas corporais que simulam que você já possui as características que deseja.

Por exemplo, se você quer ser mais confiante, aja como se já tivesse confiança, colocando seu corpo em postura de firmeza, respirando e falando em ritmo calmo, pensando. Esse ensaio estratégico ativa circuitos cerebrais, amplia repertórios emocionais e facilita uma mudança real de comportamento, especialmente porque o cérebro não diferencia completamente o que é real do que é imaginado. Com a repetição, o cérebro se familiariza cada vez mais com esse estado, até torná-lo natural.

Outra ferramenta para positivar a mente é a Prática da Gratidão. Trata-se do hábito de direcionar a atenção para aquilo que já existe de positivo em nossa vida. Nosso cérebro tem a tendência de se acostumar às coisas que já temos, deixando de valorizá-las. É a chamada adaptação hedônica.

A Prática da Gratidão nos faz voltar a perceber e valorizar o que já temos e, mais do que isso, o cérebro se acostuma a prestar atenção no que existe de positivo em qualquer situação que surja. Exemplo: Diariamente, ao acordar, antes de se levantar da cama, pense com gratidão no valor de ter mais um dia e em três coisas que você valoriza em sua vida.

Juntando essas duas práticas: Antes de se levantar e agradecer por esse dia, defina a emoção que mais lhe beneficiará ao viver esse dia. Feche os olhos e visualize a si mesmo, ao longo desse dia, experimentado ou praticando essa emoção escolhida.

Pratique isso diariamente e você começará a observar uma mudança em sua mente para maior positividade, bem-estar e facilidade para lidar com situações desafiantes.

A felicidade não é um estado constante, mas é praticável. E depende de o quanto nos empenhamos em ser os protagonistas e estrategistas de nossas vidas.


Berenice Kuenerz, psicoterapeuta, coach e mentora em gestão emocional.

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